Falar de poluição, dos tipos de partículas que contaminam o ar, da emissão de gases poluentes e do efeito estufa – um aglomerado de termos técnicos e conceitos científicos – pode ofuscar aquilo do que de fato estamos falando: o ar que respiramos. O que entra em nossos pulmões a cada segundo de cada dia e que é o requisito de uma das funções primordiais para nos mantermos vivos: respirar.

As pessoas se preocupam com a qualidade do ar que respiram?

A pesquisa “Viver em São Paulo – mobilidade urbana”, publicada no final de setembro pela Rede Nossa São Paulo, mostrou que, pelo menos entre os paulistanos, a resposta para essa pergunta é sim. Conforme os dados levantados pelo estudo, 7 em cada 10 habitantes da capital paulista buscam informações sobre a qualidade do ar com alguma frequência.

<p>(Fonte: Viver em São Paulo - mobilidade urbana)</p>

(Fonte: Viver em São Paulo - mobilidade urbana)

Os problemas de saúde causados pela má qualidade do ar também foram considerados no estudo: 40% dos entrevistados relataram que eles próprios ou alguém da família tiveram algum problema de saúde relacionado à poluição. A atenção ao problema é justificada: a má qualidade do ar está associada a uma série de complicações, como doenças cardíacas, câncer de pulmão, doenças pulmonares crônicas e infecções respiratórias.

Não é a primeira vez, contudo, que os habitantes de São Paulo se mostram preocupados com a qualidade do ar na cidade. Essa preocupação já havia sido demonstrada por outra pesquisa da Rede Nossa São Paulo. Publicado em junho deste ano, o estudo mostrou que 76% dos paulistanos são favoráveis à adoção de medidas que limitam a circulação de veículos para diminuir a poluição na cidade.

A pesquisa avaliou a percepção dos moradores em relação a medidas como inspeção veicular ambiental, limitar a circulação de veículos em algumas ruas e avenidas do centro expandido, ampliar o horário de duração do rodízio, aumentar o número de dias do rodízio, ampliar a área de rodízio e cobrar pedágio urbano para circular no centro expandido. Entre os que são favoráveis às medidas, a inspeção veicular ambiental é apontada como a medida que mais ajudaria a diminuir a poluição (30%), seguida por “limitar a circulação de veículos em algumas ruas e avenidas do centro expandido da cidade”, que tem a aprovação de 21% dos paulistanos.

<p>(Fonte: Viver em São Paulo - meio ambiente)</p>

(Fonte: Viver em São Paulo - meio ambiente)

A população começa a se mostrar favorável a medidas que reduzam ou amenizem a poluição. O aumento do rodízio de carros para dois dias é uma medida que gera resistência e ainda tem a desaprovação da maior parte dos paulistanos. Mas mesmo esse índice caiu: de 62% contrários em 2016 para 53% este ano.

A consciência do problema

Os dados levantados pelas duas pesquisas indicam que, de forma geral, a população da capital paulista está mais consciente quando o assunto é poluição e entende que a maior parte do problema é ocasionada pelo excesso de veículos nas ruas. “A conscientização da população sobre os impactos da poluição do ar na nossa saúde e a contribuição dos transportes nessa poluição é fundamental para que todos cobrem ações efetivas do poder público e, principalmente, passem a adotar hábitos mais sustentáveis no seu dia a dia”, comenta Luiza Oliveira, coordenadora de Desenvolvimento Urbano do WRI Brasil.

Na cidade de São Paulo, a frota hoje é de 8,7 milhões de veículos. Apesar de transportarem menos pessoas (30%, enquanto os ônibus levam 40%), os automóveis são responsáveis por 73% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) ao longo de um dia na capital paulista. Os ônibus, municipais e rodoviários, são responsáveis por 24% e as motos correspondem aos 3% restantes (dados disponíveis no inventário de emissões de São Paulo). O material particulado, poluente atmosférico que frequentemente atinge concentrações que ultrapassam os padrões de qualidade do ar estabelecidos, é emitido majoritariamente por automóveis (72%), considerando as partículas finas oriundas da combustão e as partículas oriundas do desgaste dos pneus, freios e pista.

Caminhos possíveis

Para amenizar a poluição e reduzir a quantidade de veículos circulando diminua, as pessoas precisam contar com uma alternativa de transporte viável para realizar seus deslocamentos diários. É onde entra o transporte coletivo. Garantir um serviço eficiente, atrativo e confiável é, ao mesmo tempo que um desafio, uma das mudanças que podem ajudar a mudar esse cenário. Para os entrevistados na pesquisa “Viver em São Paulo – mobilidade urbana”, a lotação dos veículos e o tempo do deslocamento são os principais fatores apontados como determinantes para passarem a utilizar esse modo em detrimento do carro.

Com os carros responsáveis por uma parcela tão significativa das emissões do setor de transportes na cidade, é inevitável que algumas das soluções sejam focadas nos veículos. Uma das medidas avaliadas na pesquisa da Rede Nossa São Paulo, apontada pelos moradores como a segunda mais eficiente para amenizar o problema da poluição na cidade, foi a possibilidade de “limitar a circulação de veículos em algumas ruas e avenidas do centro expandido da cidade” – uma prática que vem ganhando cada vez mais cidades adeptas pelo mundo.

Em Berlim, a “Umweltzone” cobre 88 km² da área central da cidade, onde vivem 3,4 milhões de habitantes. A área foi implementada de forma gradual desde 2008 e, hoje, apenas veículos com o chamado “selo verde” (Euro 4, veículos com filtro de partículas Euro 3 ou veículos à gasolina Euro 1) podem circular no local. Como resultados, a capital alemã viu seus índices de emissões caírem e a qualidade do ar melhorar.

<p>Sinalização da zona de baixa emissão de Berlim (Foto: Mika Meskanen/Flickr)</p>

Sinalização da zona de baixa emissão de Berlim (Foto: Mika Meskanen/Flickr)

Outro exemplo é a italiana Milão. A zona de baixa emissão da cidade foi implementada em 2008 e, apesar de ter sofrido algumas alterações com a mudança de gestão, também gerou impactos positivos para a qualidade do ar na cidade. A área abrange cerca de 8 km² e funciona permanentemente entre as 7h30 e as 19h30, de segunda à sexta. Os veículos pagam uma taxa diária para circular na região, sendo exceções apenas ambulâncias, veículos policiais e veículos elétricos e híbridos.

Zonas de baixa emissão, zonas de baixo carbono, zonas de ar limpo. O nome e as medidas que vigoram em cada caso variam, mas o objetivo é o mesmo: reduzir as emissões e melhorar a qualidade do ar. A restrição à circulação de veículos em determinadas áreas e/ou horários é uma medida eficaz e pode gerar resultados positivos. “O interessante dessas medidas é que, além de impactarem positivamente a qualidade do ar nessas regiões, também ajudam a conscientizar a população sobre o problema e podem ser catalizadores de mudanças de comportamento por parte da sociedade e poder público. Por exemplo, quem passa a usar modos ativos e coletivos de transporte em função de uma restrição de acesso de veículos, pode passar a usar esses modos mais frequentemente, em toda a cidade”, avalia Luiza.