Uma profissional multidisciplinar. Talvez esse seja o melhor adjetivo para descrever o papel desempenhado pela coordenadora de Desenvolvimento Urbano do WRI Brasil, Luiza Oliveira.

Formada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e Mestra em Estudos Urbanos pela Faculdade de Geografia da Universidade de Lausanne (Suíça), Luiza perpassa os diferentes setores do desenvolvimento urbano desde que passou a integrar a equipe do WRI Brasil. Planos de mobilidade, planejamento em escala metropolitana, planos diretores, qualidade do ar – todas as temáticas já receberam ou estão sob o olhar atento da especialista.

Nesta edição da série “Conheça o Especialista”, Luiza conta sobre sua trajetória profissional, as relações entre planejamento urbano e qualidade do ar e a importância de as cidades estabelecerem uma visão integrada em seus processos de planejamento. Confira!

 

Conte um pouco sobre sua trajetória profissional.

Sou arquiteta e urbanista e, logo que me formei, comecei a trabalhar em um escritório de arquitetura e urbanismo. Eu não sabia muito bem o que fazer quando recém-formada, mas não tinha a pretensão de trabalhar só com urbanismo. Na verdade, eu gostava um pouco de tudo: arquitetura, urbanismo, planejamento urbano, desenho urbano. Nesse escritório onde comecei a trabalhar, entre diversos projetos, surgiram alguns de Minha Casa, Minha Vida para eu fazer. Lembro que aquilo me espantou um pouco, porque eram terrenos enormes, nos quais era preciso colocar o máximo de unidades possíveis, e muitas vezes eu sequer tinha a chance de conhecer o local. Resolvi deixar de trabalhar nesses projetos e voltei a estudar, dessa vez mais focada em planejamento urbano e desenvolvimento urbano, e comecei um mestrado em estudos urbanos em uma faculdade de geografia na Suíça. Nessa época, comecei a conhecer mais sobre mobilidade sustentável, eficiência energética, o aspecto social no planejamento urbano. Foi uma experiência muito interessante: ali eu me transformei em uma urbanista, 100%. Quando voltei para o Brasil, alguns meses depois já comecei a trabalhar no WRI. E aqui, logo que entrei, era responsável pelo trabalho com planos de mobilidade.

 

Como é o seu trabalho no WRI Brasil?

Comecei a trabalhando com planos de mobilidade. O objetivo era ajudar as cidades brasileiras a construírem planos de mobilidade urbana sustentáveis. O WRI Brasil elaborou uma metodologia – Sete Passos: como construir um plano de mobilidade urbana –, que é um método de processo de planejamento urbano. Ou seja: o que precisamos fazer no nosso município para, no final desse processo, termos um plano de mobilidade. Fiquei encarregada por levar essa metodologia para as cidades brasileiras e engajá-las a utilizarem-na na elaboração de seus planos.

Aqui no WRI Brasil, trabalhamos nos nossos projetos normalmente a partir da perspectiva de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE). Mas, no começo desse ano, começamos a mudar um pouco a nossa perspectiva e passamos a trabalhar sob o enfoque da qualidade do ar. Em relação à qualidade do ar, o objetivo do WRI Brasil é seguir o trabalho que já fazemos, mas considerando o impacto dos nossos projetos na qualidade do ar nas cidades brasileiras. Quando temos impacto positivo na qualidade do ar, também temos impacto na redução de emissões de GEE e no combate às mudanças climáticas. O que acontece é que a questão da qualidade do ar é mais próxima dos gestores públicos – porque a poluição causa 50 mil mortes por ano no Brasil, as pessoas sofrem com asma, rinite, sentem-se mal quando o ar é poluído. É possível agir de forma muito mais impactante a partir dessa perspect iva.

 

Sabemos que os transportes são responsáveis por grande parcela das emissões nas cidades. Como as cidades podem usar seus instrumentos de planejamento – plano de mobilidade, plano diretor – para reduzir ou amenizar a poluição do ar?

Vejo a melhora da qualidade do ar como um resultado. O impacto positivo que iremos atingir ao final de alguns processos. Quando pensamos em planejamento urbano, ou no planejamento da mobilidade, ou em projetos de transporte sustentável, é possível pensar nesses tópicos sob o enfoque da qualidade do ar. Ou seja, não se trata de criar um plano municipal específico sobre qualidade do ar, mas de integrar esse elemento [qualidade do ar] nos projetos já existentes. E um ponto de extrema importância para que as cidades consigam obter resultados positivos nesse processo é estabelecer uma visão integrada de seus projetos e planej amento.

 

Em se tratando da gestão das cidades, nada pode ser tratado isoladamente. Como você vê a relação entre planejamento urbano, mobilidade, qualidade do ar e mudanças climáticas e como as cidades podem endereçar essas questões de forma realmente integrada?

Existem diversas maneiras de tratar essas questões de forma integrada nas cidades. Eu, Luiza, acredito que uma ferramenta essencial nesse sentido é o Plano Diretor. O Plano Diretor o principal instrumento de planejamento das cidades. Se no processo de construção desse plano a cidade já for capaz de inserir esses tópicos de forma integrada, depois fica muito mais fácil. É preciso reunir as diferentes secretarias e setores – transportes, desenvolvimento urbano, saúde, qualidade do ar – para pensar o planejamento da cidade em conjunto. A partir daí, é possível dar continuidade a esse objetivo nos planos setoriais e projetos específicos. Quando formos detalhar os desafios de mobilidade no plano de mobilidade, por exemplo, a qualidade do ar estará presente, porque essa visão já foi estabelecida no Plano Diretor. E esse é um desafio que encontramos nas cidades brasileiras – a falta de integração entre as secretarias municipais. Às vezes, acontece de trabalharmos em parceria com determinada cidade; então conversamos com uma secretaria x, depois conversamos com outra, mas elas não conversam entre si. Encontrar mecanismos de governança para que as secretarias municipais passem a trabalhar de forma mais integrada é um dos maiores desafios das cidades.

 

Como o WRI Brasil pode contribuir com esse tema, que é uma interseção de dois dos nossos programas (Clima e Cidades)?

A temática da qualidade do ar ter entrado no escopo de trabalho do WRI Brasil de foi uma grande oportunidade. De um lado, temos o time que trabalha no programa de Cidades, que possui um alto nível de conhecimento em relação a desafios práticos das cidades – como solucionar um problema de mobilidade, como construir um bom Plano Diretor. De outro, temos a equipe de Clima, que entende a outra dimensão do assunto – qual o impacto das nossas decisões para o meio ambiente, o clima e em termos de emissões de poluentes. Unindo essas duas áreas de conhecimento, temos tudo para realizar um trabalho coerente e, ao mesmo tempo, oferecer soluções práticas aos gestores públicos, sejam eles de nível municipal, estadual ou federal.

 

Que desafios e caminhos você enxerga para essas áreas?

Na minha visão, o grande desafio do desenvolvimento urbano é tentar não isolar as caixinhas. Não pensar “a gente faz isso ou a gente faz aquilo”. O que precisamos é usar as oportunidades que temos para costurar cada vez mais nossas áreas de atuação, porque as coisas não acontecem de forma isolada. Quando estamos trabalhando pelo transporte sustentável, também estamos trabalhando pela qualidade do ar. Quando trabalhamos com governança, também trabalhamos por inclusão social. As coisas não são isoladas umas das outras. Um aspecto positivo do meu cargo, das atividades que me foram delegadas, é poder atuar com tantas questões diferentes. Porque isso me dá a oportunidade de costurar todas essas áreas.