Este post foi escrito por Andrew Wu e Caroline Gagné e publicado originalmente no WRI Insights.


No Desafio de Bonn, o mais ambicioso pacto de restauração do mundo, lideranças globais comprometeram-se a restaurar 168 milhões hectares de terras degradas – uma área maior que o território do Irã – ao longo dos próximos 12 anos. O processo de restauração de paisagens utiliza plantas e o solo para retirar dióxido de carbono da atmosfera, crucial para mantermos o aumento da temperatura média do planeta abaixo de níveis potencialmente desastrosos, como apontou o último relatório do IPCC. Para isso, uma estratégia-chave é transformar áreas degradadas em florestas, pastagens e fazendas saudáveis. E é exatamente esse o objetivo dos compromissos dos governos no Desafio de Bonn e em suas contrapartes regionais – a Inciativa 20x20 na América Latina e a AFR100 na África.

Embora os esforços nacionais e internacionais geralmente sejam as manchetes, é igualmente importante reconhecer o papel dos governos locais, regionais e estaduais para obter resultados positivos. Governos nacionais podem considerar uma questão delicada e politicamente desafiadora a implementação de políticas de longo alcance sem evidências substanciais de que as medidas previstas funcionam. Os governos regionais, por outro lado, podem testar políticas dentro de sua jurisdição e, com isso, fornecer modelos que podem ser replicados e ampliados.

Os compromissos de restauração do Brasil mostram como as ações climáticas em escala nacional e subnacional podem se complementar e avançar juntas. A Mata Atlântica, que cobre mais de 150 milhões de hectares ao longo da costa do país, é a segunda maior floresta tropical da América do Sul, um tesouro de biodiversidade e um importante sumidouro de carbono. No entanto, as florestas correm perigo há décadas devido à ação dos setores da pecuária e da agricultura. A perda de florestas prejudicou de forma considerável os sistemas naturais que regulam a água, contribuindo para a escassez de água em grandes cidades como São Paulo.

Unindo forças pela Mata Atlântica

Desde 2006, atores locais da região uniram forças para dar início a um movimento de restauração. Em 2009, uma assembleia reunindo representantes de diversos estados brasileiros, organizações não-governamentais, empresas e institutos de pesquisa lançou o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica. E em 2011, o programa se comprometeu a restaurar um milhão de hectares através do Desafio de Bonn.

Embora o Pacto represente uma coalizão bem-sucedida de atores subnacionais, entes de representação federal – e fontes de financiamento – estavam visivelmente ausentes. A coalizão se adaptou, mantendo o foco nos compromissos regionais e construindo do zero um movimento político pela causa. O pacto trabalhou ativamente para colocar a restauração no centro das atenções, produzindo uma série de relatórios e artigos que enfatizam as oportunidades ambientais, sociais e econômicas da restauração em toda a região da Mata Atlântica e no Brasil de forma mais ampla.

Essas discussões logo geraram frutos. Em 2015, os estados do Espírito Santo, São Paulo e Mato Grosso anunciaram suas próprias metas de restauração e seus compromissos no Global Landscapes Forum de restaurar 3,28 milhões de hectares. Enfrentando a pressão das lideranças estaduais, o governo federal agiu no ano seguinte, prometendo restaurar 12 milhões de hectares de áreas desmatadas até 2030, no âmbito do Desafio de Bonn e da Iniciativa 20x20, um compromisso que ampliou a ambição das promessas feitas no Pacto e em nível estadual. A estratégia foi um sucesso. Até hoje, o movimento de restauração no Brasil é respaldado por políticas nacionais, com um abrangente plano nacional de restauração – o [PLANAVEG](http://www.mma.gov.br/images/arquivo/80049/Planaveg/PLANAVEG_revisado_Site SBio.pdf) – emitido como um decreto federal em 2017.

No momento em que representantes de nações de todo o mundo estão reunidos em Katowice, na Polônia, para a COP 24, é importante manter a escala desses resultados em mente. Mesmo que políticas estaduais referentes ao clima e às florestas representem apenas uma fração do uso da terra e das emissões de país, são instrumentos valiosos, pois permitem testar e demonstrar as possibilidades de se implementar ações semelhantes em escala nacional. O impacto das políticas estaduais não deve ser limitado aos estados. Como mostra o movimento pela restauração no Brasil, essas políticas podem ser o começo de algo muito maior.