Porto Alegre está em meio ao processo de elaboração do seu Plano de Mobilidade Urbana, que deve ser entregue até abril para atender ao prazo estabelecido pela Política Nacional de Mobilidade Urbana. Um dos grandes desafios que as cidades brasileiras enfrentam para tornar esse instrumento de fato transformador é captar os anseios da sociedade – sem distinções. Afinal, ele irá definir os investimentos do município em mobilidade por muitos anos, com metas de curto, médio e longo prazo.

Em uma época em que tempo é um recurso bastante escasso e ouvir – no sentido de ter empatia e dedicar atenção – é uma raridade, experimentar novos formatos pode ser uma maneira de vencer o desafio de identificar as demandas de uma amostra ampla da população. Por isso, um grupo de entidades da sociedade civil organizou um Hackatown, que vem do inglês “hack a town” e significa hackear uma cidade. Foi uma imersão de três dias com o intuito de criar soluções para a mobilidade da cidade em dez eixos temáticos presentes no Plano de Mobilidade (transporte ativo a pé, transporte ativo sobre rodas, transporte público coletivo, transporte individual motorizado, transporte de carga e logística, transporte sob demanda – táxis e aplicativos –, segurança pública, segurança viária, acessibilidade universal, comunicação e educação para a mobilidade).

<p>Participantes durante o primeiro dia de atividades (foto: Marcos Oliveira/Divulgação)</p>

Participantes durante o primeiro dia de atividades (foto: Marcos Oliveira/Divulgação)

Com o objetivo de reunir sugestões para toda a cidade, WRI Brasil, Hackatown, Point - Facilitação Criativa, Minha Porto Alegre, Shoot The Shit, Mercado Brasco e Global Shapers, organizadores do evento, buscaram selecionar os participantes mais diversos possíveis para as 60 vagas disponíveis. Para isso, foram considerados critérios de diversidade relacionados a gênero, raça, território, idade, pessoas com deficiência e identidade de gênero, com o objetivo de trazer as visões mais diversas da cidade para o evento, que contou com intérprete de libras e aconteceu em local acessível aos usuários de cadeiras de rodas e com estrutura para receber crianças que viessem acompanhando os pais.

Diversidade que se traduz em soluções

A representatividade resultou em um grande engajamento do grupo ao longo do final de semana. Ao ter a oportunidade de olhar para o lado e debater com pessoas que vivem diferentes realidades da cidade, mas com a visão em comum de sonhar com um lugar melhor para viver, muitos participantes encerraram o evento com a sensação de que participaram de algo transformador. “Trabalhamos muito para realmente garantir a diversidade. Em grupos homogêneos, as ideias são sempre parecidas e nem sempre fazem sentido para boa parte da população. Se tivéssemos que escolher uma prioridade na realização deste hackatown, com certeza seria a diversidade. Isso trouxe uma riqueza muito especial, ponto de vista muito legais para as soluções", explica Fernanda Verdi, uma das organizadoras do projeto Hackatown.

“Participar do Hackatown foi a experiência mais incrível que tive desde que entrei no universo acadêmico. Pensar em soluções criativas para mobilidade urbana da capital foi enriquecedor, muito pelo processo de construção das ideias ser contemplado com outras vivências, mas também pela curadoria que era oferecida a todos. Com toda certeza irei participar de outros eventos como esse, pois será importante para a sociedade e a mim como comunicador e cidadão”, Fabrício Lemos, estudante de comunicação.

Alguns membros da prefeitura da cidade, especialmente os envolvidos com a elaboração do Plano de Mobilidade, participaram como ouvintes ou como mentores dos grupos. Também exerceram esse papel outros especialistas na área, como professores universitários, arquitetos e urbanistas, técnicos do planejamento metropolitano, entre outros. Nos dois primeiros dias, além de ouvirem a palestras técnicas sobre o planejamento da mobilidade, os grupos criaram as chamadas personas (uma espécie de cidadão imaginário), para então definir os problemas de mobilidade que ela enfrenta. No dia seguinte, o tempo foi dedicado à criação e apresentação das soluções voltadas para essas personas.

Surgiram ideias como divulgação de um manual para construção e reforma de calçadas, criação de infraestruturas específicas para dar conforto e segurança a ciclistas e motoristas e sugestões para melhorar o impacto dos aplicativos de mobilidade. Além das soluções em si, o encontro serviu para que a importância do processo de elaboração do plano de mobilidade urbana fosse difundido e que uma amostra bastante representativa da cidade pudesse levar sua voz até a gestão municipal. "Foi importante ouvir o resultado dessas discussões e perceber que a sociedade já tem consciência que ela é parte da solução das cidades. É com inovação, parceria e muitos desafios que o poder público deve buscar alternativas para uma cidade melhor", destaca o diretor-presidente da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), Marcelo Soletti.