Este post foi publicado originalmente no WRI Insights.


As pesquisas mais recentes são claras: para evitar os piores impactos da mudança do clima, as emissões globais de gases de efeito estufa (GEE) não precisam apenas cair pela metade nos próximos dez anos – as emissões líquidas precisam zerar até a metade do século.

Reconhecendo essa urgência, o secretário-geral da ONU pediu recentemente aos líderes nacionais que comparecessem à Cúpula de Ação Climática da ONU com anúncios de metas para atingir emissões líquidas zero até 2050. Vários países já se comprometeram a fazê-lo, juntamente com alguns estados, cidades e empresas.

A seguir, mostramos o que significa “emissões líquidas zero”, explicamos a ciência por trás dessa meta e elencamos quais países já estabeleceram esse compromisso.

1. O que significa zerar as emissões líquidas?

Conseguiremos chegar a emissões líquidas zero quando todas as emissões de GEE que ainda forem causadas pelo homem alcançarem equilíbrio com a remoção de gases da atmosfera (um processo conhecido como remoção de carbono). Em primeiro lugar, é preciso reduzir ao mais próximo de zero possível todas as emissões causadas pela atividade humana – como as de veículos e fábricas movidas a combustíveis fósseis, por exemplo. Depois disso, quaisquer emissões de GEE restantes seriam equilibradas com uma quantidade equivalente de remoção de carbono – por exemplo, restaurando florestas ou através da tecnologia de captura e armazenamento direto do ar (DACS). O conceito de emissões líquidas zero é semelhante à "neutralidade climática".

2. Quando o mundo precisa zerar as emissões líquidas?

Sob o Acordo de Paris, os países concordaram em limitar o aquecimento global a menos de 2°C, idealmente 1,5°C. Os impactos climáticos já sentidos em todo o mundo, mesmo com apenas 1,1°C de aquecimento – do derretimento do gelo a ondas de calor devastadoras e tempestades mais intensas –, mostram a urgência de conter o aumento da temperatura. As pesquisas científicas mais recentes sugerem que, para cumprir as metas do Acordo de Paris, o mundo precisará atingir emissões líquidas zero dentro dos seguintes prazos:

  • Limitando o aquecimento a 1,5°C: as emissões líquidas de dióxido de carbono (CO2) chegam a zero em média entre 2050 (considerando um cenário em que se ultrapasse em pouco ou nada o limite de 1,5°C) e 2052 (considerando que se ultrapasse o limite dos 1,5°C antes de reverter o aquecimento). Nesse cenário, as emissões líquidas totais de GEE chegam a zero entre 2063 e 2068.

  • Aquecimento de 2°C: as emissões líquidas de CO2 são zeradas entre 2070 (66% ou mais de chances de limitar o aquecimento a 2°C) e 2085 (50% a 66% de chances de limitar o aquecimento a 2°C). Nesse cenário, as emissões líquidas totais de GEE chegam a zero no fim do século.

O Relatório Especial sobre o Aquecimento Global de 1,5°C, do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), conclui que, se o mundo zerar as emissões líquidas uma década mais cedo, em 2040, a chance de limitar o aquecimento a 1,5°C é consideravelmente mais alta. Quanto mais cedo atingirmos o pico de emissões (e quanto mais baixo for esse pico), mais realista a chance de zerarmos as emissões líquidas a tempo de evitar consequências piores. Dessa forma, também não ficaríamos tão dependentes de medidas de remoção de carbono na segunda metade do século.

É importante ressaltar que o prazo para zerar as emissões líquidas varia se considerarmos apenas o CO2 ou todos os principais gases de efeito estufa (incluindo metano, óxido nitroso e "gases F", como hidrofluorcarbonetos, comumente conhecidos como HFCs). Para emissões que não sejam de CO2, o prazo limite é posterior, dado que algumas dessas emissões – como a do metano de fontes agrícolas – são consideradas um pouco mais difíceis de eliminar gradualmente. No entanto, esses gases elevarão as temperaturas no curto prazo, potencialmente atingindo ou até ultrapassando muito mais cedo o limite de 1,5°C.

Por esse motivo, é importante que os países especifiquem se suas metas para zerar as emissões líquidas incluem apenas emissões de CO2 ou todos os principais GEE. Uma meta abrangente incluiria todos os principais gases.

3. Todos os países precisam zerar suas emissões líquidas ao mesmo tempo?

As linhas de tempo do gráfico acima são médias globais. Como as economias e os estágios de desenvolvimento dos países variam, não existe um cronograma único. Existem, no entanto, limites físicos rígidos para a quantidade de emissões que a atmosfera pode suportar. No mínimo, grandes emissores (como Estados Unidos, União Europeia e China) devem zerar suas emissões líquidas de GEE até 2050, ou será difícil fechar essa conta, independentemente dos esforços dos outros países. No cenário ideal, os principais emissores atingirão o zero líquido muito antes, dado que grandes economias desempenham um papel significativo na trajetória das emissões globais.

4. Quantos países tem metas para zerar as emissões líquidas?

Atualmente, 15 países já adotaram metas para zerar as emissões líquidas: Butão, Costa Rica, Dinamarca, Fiji, Finlândia, França, Islândia, Japão, Ilhas Marshall, Noruega, Portugal, Suécia, Suíça, Reino Unido e Uruguai. Uma lista atualizada pode ser encontrada aqui. Embora novos países anunciem metas todos os meses, a porcentagem de emissões globais cobertas por alguma meta desse tipo ainda gira em torno de apenas 5%. Algumas dessas metas já estão previstas em leis, outras estão presentes em outros documentos políticos. Algumas, ainda, foram incorporadas diretamente nas estratégias de longo prazo de desenvolvimento de baixa emissão, enquanto outros países estabeleceram suas metas para zerar as emissões líquidas antes de submeter uma estratégia de longo prazo.

Outros países e regiões propuseram a adoção de metas líquidas zero, incluindo Chile, Irlanda, Países Baixos, Nova Zelândia, Espanha e União Europeia.

5. Como zeramos as emissões líquidas?

Política, tecnologia e comportamento precisam mudar de forma geral. Nos cenários que limitam o aquecimento do planeta a 1,5°C, as energias renováveis são projetadas para fornecer de 70% a 85% da eletricidade até 2050. As medidas de eficiência energética e troca de combustível são essenciais no setor de transporte. Melhorar a eficiência da produção de alimentos, mudar as escolhas alimentares, parar o desmatamento, restaurar áreas degradadas e reduzir a perda e o desperdício de alimentos também têm um potencial significativo para reduzir as emissões. É fundamental que a transição estrutural e econômica necessária para limitar o aquecimento a 1,5°C seja abordada de maneira justa, especialmente para os trabalhadores de indústrias de alto carbono. A boa notícia é que a maioria das tecnologias de que precisamos já estão disponíveis e são cada vez mais competitivas em termos de custos em relação às alternativas de alto carbono. Aos poucos, os mercados estão abrindo os olhos para essas oportunidades e para os riscos de uma economia de alto carbono – e fazendo as mudanças necessárias.

6. O Acordo de Paris obriga os países a zerarem suas emissões líquidas?

Em resumo: sim.

O Acordo de Paris tem como objetivo de longo prazo alcançar “um equilíbrio entre as emissões causadas pela atividade humana e a remoção de gases de efeito estufa na segunda metade deste século, com base na equidade, no contexto de desenvolvimento sustentável e nos esforços para erradicar a pobreza”. O conceito de equilibrar emissões e remoções é semelhante a atingir emissões líquidas zero.

Junto ao objetivo final de limitar o aquecimento do planeta a 2°C, idealmente 1,5°C, o Acordo de Paris compromete os governos a reduzirem drasticamente as emissões e a intensificarem os esforços para zerar as emissões líquidas a tempo de evitar as piores consequências das mudanças climáticas. O Acordo também convida os países a apresentarem estratégias de longo prazo para o desenvolvimento de baixo carbono, que devem mostrar como os países pretendem fazer essa transição e, ao mesmo tempo, podem ser um estímulo para que estabeleçam metas para zerar as emissões líquidas.

No espírito do Acordo de Paris, os países deveriam comparecer à Cúpula de Ação Climática da ONU com o compromisso de criar metas ousadas de curto e longo prazo, alinhadas com um futuro de emissões líquidas zero. Isso enviaria uma mensagem importante a todos os níveis do governo, ao setor privado e à população: as lideranças globais estão apostando em um futuro seguro e próspero, e não em um devastado pelos impactos climáticos.