Este post foi escrito por Helen Mountford e publicado originalmente no WRI Insights.


Lideranças mundiais em breve estarão reunidas na cidade de Nova York para uma cúpula sobre um desafio urgente que afeta todos os aspectos de nossas vidas, da economia aos empregos, da segurança à migração e à nossa saúde. Estamos falando, claro, da crise climática.

As dezenas de milhares de incêndios que atingiram recentemente a Floresta Amazônica podem ter sido iniciadas por seres humanos, mas as condições de uma Amazônia mais seca podem levar as chamas a se espalharem rapidamente. De forma semelhante, as temperaturas no Ártico estão atingindo recordes cada vez mais altos, e um verão abrasador no Hemisfério Norte tirou a vida de centenas de pessoas e deixou outras centenas de milhões desesperadas por ajuda. Uma nova análise do The Washington Post descobriu que 10% do mundo se tornou uma zona quente perigosa, que já aqueceu mais de 2°C.

Se existe um lado positivo, é que a realidade desses graves impactos ao redor do mundo e as terríveis previsões para o futuro despertaram um movimento civil global que reivindica a seus líderes a ação climática. Os jovens, em particular, estão chamando a atenção por meio de greves nas escolas, e pessoas em todos os lugares exigem que passemos a chamar a situação pelo que de fato é: uma crise que requer ação urgente. Cada vez mais empresas, investidores e pessoas físicas reconhecem que um caminho de crescimento de baixo carbono e resiliente ao clima também é uma importante oportunidade econômica e de desenvolvimento. Inovações e queda de custos em tecnologias limpas – como energias renováveis, armazenamento de baterias e veículos elétricos – e um despertar dos mercados financeiros para o risco de crescimento de alto carbono estão reforçando essa mudança. Em suma, o mundo real está se movendo mais rápido que os políticos. Chegou a hora dos líderes nacionais intensificarem e ajudarem, em vez de impedir, a transição global em andamento.

É nesse novo contexto de conscientização que os líderes mundiais se reunirão para a Cúpula de Ação Climática das Nações Unidas em 23 de setembro. A última cúpula da ONU desse tipo, em 2014, foi um importante marco político que ajudou a catalisar a adoção do Acordo de Paris e a submissão de compromissos climáticos nacionais de quase 200 países no ano seguinte. O secretário-geral da ONU, António Guterres, está organizando a cúpula de 2019 em busca de um objetivo semelhante: gerar o momento político necessário para 2020, quando os países deverão acelerar a ação e fortalecer seus compromissos em uma escala proporcional ao tamanho do desafio que temos nas mãos.

Os líderes nacionais têm três tarefas principais na Cúpula de Ação Climática da ONU:

1. Comprometer-se a zerar as emissões líquidas até 2050

O relatório de 2018 do IPCC revelou que, embora o mundo vá enfrentar grandes impactos climáticos com um aquecimento de 1,5°C, esses efeitos ficam significativamente piores com um aquecimento de 2°C – mais exposição ao calor extremo, queda nas colheitas, pesca menos produtiva, entre outros. Limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais deve ser o novo norte da ação climática para todos nós – países, cidades, empresas e sociedade civil. Precisamos reduzir drasticamente as emissões em toda a economia global, construindo resiliência e nos adaptando aos graves e inevitáveis impactos das mudanças climáticas. A cúpula da ONU em Nova York é a primeira chance desde o relatório do IPCC de colocar os chefes de Estado em foco e exigir uma resposta.

Para avançar no caminho de 1,5°C, o secretário-geral Guterres pediu que todos os países se comprometam a zerar suas emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2050, uma vez que o relatório do IPCC deixou claro que essa é uma necessidade em escala global. Suriname e Butão estão liderando o caminho: os dois países já absorvem mais gases de efeito estufa do que emitem. Até o momento, outros 15 países adotaram ou propuseram legislações com meta de zero emissões líquidas (algumas em prazos ainda mais curtos que 2050). Isso inclui países desenvolvidos como Noruega, Suécia, Nova Zelândia e Reino Unido, mas também nações em desenvolvimento como Chile, Uruguai, Costa Rica, Fiji e Ilhas Marshall.

Os compromissos assumidos até o momento são inspiradores e necessários, mas precisamos de ações semelhantes por parte de muitos outros países, especialmente os maiores emissores. Na Cúpula do Clima da ONU, os líderes devem tranquilizar o público e seus pares de que tomarão as medidas necessárias para descarbonizar suas economias até o meio do século ou antes.

Pesquisas recentes na Indonésia, no México e na China destacam os benefícios da ação climática para esses países. No início deste ano, por exemplo, a Iniciativa de Desenvolvimento de Baixo Carbono do governo da Indonésia descobriu que, se o país mudar para um caminho de desenvolvimento de baixo carbono, poderá gerar uma média de crescimento anual do PIB de 6% até 2045, bem como mais empregos, melhores resultados para a saúde e benefícios regionais e de gênero.

Os países podem continuar resistindo ao inevitável – ou podem aproveitar essa oportunidade e proporcionar um crescimento mais equitativo e sustentável e uma economia competitiva de baixo carbono. A Cúpula é o momento de acelerar a transição para um futuro melhor e mais seguro.

2. Fortalecer seus compromissos climáticos nacionais no âmbito do Acordo de Paris até 2020

Quando o Acordo de Paris foi assinado em 2015, os países concordaram em aumentar a ambição de seus compromissos climáticos nacionais – conhecidos como contribuições determinadas nacionalmente ou NDCs – a cada cinco anos. Guterres reforça o pedido de que todos os países façam isso em 2020, alinhando essas metas de curto prazo com o objetivo de manter o aquecimento do planeta abaixo de 1,5°C. Na Cúpula de Ação Climática da ONU, é vital que as lideranças nacionais, especialmente aquelas dos maiores emissores, deixem claro que apresentarão metas climáticas ambiciosas no próximo ano. Este será um sinal crítico para saber se o mundo cumprirá os objetivos do Acordo de Paris.

Índia e China indicaram, em declarações conjuntas recentes com a França, que atualizarão seus compromissos nacionais “de maneira a contemplar uma progressão além da atual e refletindo a maior ambição possível” e que estão comprometidas em apresentar estratégias climáticas de longo prazo no próximo ano. Os líderes desses países, assim como os de outras grandes economias, precisam chegar à Cúpula preparados para anunciar que intensificarão seus compromissos do Acordo de Paris.

Esses novos compromissos nacionais devem ser colocados sobre a mesa no próximo ano e podem incluir não apenas metas de redução de emissões de GEE, mas um amplo leque de possibilidades: políticas para acelerar a adoção de energias renováveis, investimento em veículos elétricos, redução do desperdício de alimentos, proteção e restauração de florestas e mangues – que sequestram carbono e protegem as comunidades costeiras de tempestades.

3. Avançar outras iniciativas e fontes de financiamento para tornar possível um futuro de zero emissões

Durante a cúpula, esperamos que muitas cidades, estados e empresas apresentem novas iniciativas ou reforcem os esforços existentes para enfrentar a crise do clima. Alguns desses anúncios podem mudar o jogo da ação climática. Muitas dessas iniciativas serão empreendidas em conjunto com os governos nacionais e todas devem contribuir para compromissos climáticos nacionais mais fortes e para zerar as emissões líquidas dos países. Simultaneamente, a ação climática nacional pode enviar sinais claros e estáveis para incentivar ainda mais ações e inovações por parte das cidades e do setor privado.

Por exemplo, as cidades podem economizar para os consumidores centenas de bilhões de dólares em custos de energia fazendo a transição para edifícios neutros em carbono. Governos e empresas podem trabalhar juntos para aumentar a proporção de veículos limpos. Vinte e oito grandes empresas em todo o mundo já se comprometeram com a meta de 1,5°C. E, felizmente, muitos outros seguirão essa liderança na Cúpula.

A Cúpula também é uma grande oportunidade para os líderes mostrarem que a economia global está passando por uma mudança fundamental do financiamento “marrom” para o “verde”, que transformará nossos sistemas industriais e de transporte e criará empregos limpos. Um passo crítico nessa direção é interromper o financiamento e a construção de usinas de carvão, que são a maior fonte de poluição de carbono do mundo. A construção de novas usinas de carvão também é cada vez mais cara que as de fontes renováveis, e uma vez incluídos os custos de saúde da poluição do ar, o carvão se torna um acordo econômico ainda pior. Essencial para o sucesso será um gerenciamento cuidadoso dessa transição, para garantir que esse seja um processo justo e não deixe ninguém para trás.

Cabe ressaltar que promessas ambiciosas não serão suficientes se não houver dinheiro para executá-las. Os países desenvolvidos devem aumentar o apoio financeiro à ação climática aos países em desenvolvimento, que geralmente são os mais vulneráveis aos seus efeitos. Isso deve incluir um aumento significativo dos investimentos em resiliência climática para proteger as comunidades de impactos climáticos como secas, aumento do nível do mar e calor extremo. Um relatório recente da Comissão Global de Adaptação conclui que investir US$ 1,8 trilhão globalmente em resiliência climática de 2020 a 2030 pode gerar US$ 7,1 trilhões em benefícios líquidos totais.

Um planeta para todos

Entre os dias 20 e 27 de setembro, cidadãos preocupados – liderados por jovens ativistas – tomarão as ruas exigindo que os líderes globais acordem para a realidade de que uma abordagem suave à ação climática não chega nem perto de ser suficiente: para combater as mudanças climáticas, precisamos mudar o sistema.

As lideranças globais e a ONU também têm outros objetivos urgentes em seu radar, incluindo a redução da pobreza, o desenvolvimento sustentável e a interrupção da crise de extinção de espécies. No entanto, há um reconhecimento crescente de que qualquer um desses objetivos não pode ser alcançado de forma isolada: sem enfrentar as mudanças climáticas, todos os outros objetivos correm o risco de ficar fora de alcance e vice-versa. A Cúpula de Ação Climática da ONU, e a Cúpula dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que acontece na sequência, são uma oportunidade para vincular essas agendas e demonstrar como ações para reduzir emissões, descarbonizar indústrias e adaptar-se aos impactos climáticos cada vez mais severos podem ajudar a construir um futuro melhor, que inclua empregos de qualidade, economias mais fortes, saúde e alimentação melhores para todos. Essa é a nova história de crescimento que precisamos contar no século XXI.