Mesmo com poucas cidades brasileiras aderindo à eletromobilidade no transporte coletivo até o momento, o mercado dá sinais de crescente interesse no país. Um levantamento do WRI Brasil identificou que novos fabricantes farão investidas no Brasil nos próximos anos, ofertando ao menos 32 diferentes modelos de ônibus elétricos a bateria. É uma perspectiva que tem potencial de acelerar a necessária transição de frotas de ônibus urbanos, com competitividade entre fabricantes e possível queda no custo.

A implementação de ônibus elétricos a bateria nas frotas de transporte coletivo é uma necessidade cada vez mais urgente, seja para reduzir emissões ou para aumentar a qualidade do serviço prestado. É uma mudança com potencial de salvar vidas por conta da redução da poluição do ar, além de proporcionar mais conforto aos passageiros. Em Santiago, que lidera a implementação na América Latina, as pessoas declaram estar dispostas a esperar mais tempo para andar nos ônibus elétricos a bateria, que recebem avaliação 50% melhor do que os ônibus a diesel novos, padrão Euro VI.

Em todo o Brasil, há 47 ônibus elétricos a bateria em operação. Além de representar menos de 2% da frota latino-americana, a frota brasileira está concentrada em poucas cidades, como São Paulo e Campinas. Mas o contexto para acelerar a transição tem melhorado de forma contínua. Recentemente, a iniciativa ZEBRA anunciou uma coalizão de fabricantes e investidores que vai injetar US$ 1 bilhão para aquisição de ônibus elétricos na América Latina, incluindo o Brasil.

As cidades brasileiras ainda precisam superar alguns desafios, a começar por dúvidas e desconhecimento acerca da tecnologia e da oferta de veículos elétricos no país. Para apoiar a transição, o WRI Brasil conduziu um levantamento que projeta as perspectivas desse mercado para 2025. Ele permite que cidades e empresas operadoras avaliem se a oferta de veículos atende a requisitos operacionais do projeto, como autonomia e eficiência energética, e a aspectos financeiros como custos de veículos e carregadores e possibilidades de aquisição.

Perspectivas de um futuro eletrizante

O levantamento do WRI Brasil foi feito com 14 fabricantes de ônibus elétricos a bateria que já possuem frota operante na América Latina ou são grandes players globais. Oito demonstraram interesse no mercado brasileiro: BYD, Eletra, Foton, Higer, Mercedes-Benz, Skywell, Sunwin e Zhongtong. Juntas, as empresas informaram intenção de ofertar 32 modelos de ônibus elétricos a bateria – 12 de porte padron, 10 articulados e 10 de portes menores, com 8,5 a 10,5 metros de comprimento.

<p>gráfico sobre quantidade de modelos de ônibus elétrico por tamanho</p>

O aumento, tanto do número de fabricantes quanto da oferta de modelos, traz mais competitividade ao setor e pode inclusive favorecer uma queda nos preços e mudança nas condições de aquisição desses ônibus.

Autonomia para operar em grandes cidades

Um dos fatores cruciais para a transição para ônibus elétricos é a autonomia, ou seja, quantos quilômetros o veículo pode rodar sem necessitar de recarga. Entre os modelos apresentados, boa parte já atende à autonomia requerida. Além disso, segundo os fabricantes, a autonomia dos ônibus pode ser ampliada conforme a necessidade da cidade, adaptando-se o pacote de baterias.

Em cidades brasileiras com mais de 500 mil habitantes, um ônibus municipal percorre em média 257 quilômetros em um dia útil (considerando dados da ANTP e quilometragem de um dia útil equivalente). Nesse cenário, dentre 27 ônibus cuja autonomia foi informada pelos fabricantes, 5 de 10 ônibus padron e 6 de 9 de pequeno porte atendem ao requisito (considerando operação com ar-condicionado, que aumenta o consumo de energia). A maioria dos articulados tem autonomia inferior a 257 km. Porém, veículos desse porte não costumam operar o dia inteiro, de modo que a menor autonomia não é um limitador significativo.

<p>gráfico sobre autonomia dos modelos por tipologia, em comparação ao percurso médio diário das cidades brasileiras</p>

Possibilidades de financiamento

A transição para frotas mais limpas também costuma esbarrar no custo de capital, os altos investimentos iniciais em veículos. A maior parte dos modelos de ônibus ofertados vem diretamente do exterior. Pelas políticas tributárias atuais, os impostos que incidem durante o processo de importação praticamente dobram o valor original do veículo. Um ponto positivo para contornar essa situação foi que 6 dos 8 fabricantes estão abertos a outros modelos de aquisição, como o leasing, modelo que pode atenuar os custos de capital e viabilizar a aquisição dos veículos.

A tecnologia também vem tendo seu custo reduzido. Nos últimos 10 anos, os custos das baterias caíram aproximadamente 80%. No levantamento, o custo das baterias representou cerca de 40% do custo do veículo. Se a tendência de redução se mantiver – o que é esperado –, deve haver queda significativa nos preços finais dos ônibus elétricos a bateria. Alguns fabricantes consultados confirmaram expectativa de reduzir em até 20% o valor dos veículos em 2025.

Além disso, a maioria dos fabricantes também se mostrou aberta a conversar sobre a possibilidade de ceder veículos para testes nas cidades, o que pode melhorar a confiança na tecnologia por parte das cidades e demais atores locais.

Um passo importante para a transição avançar

Entender a oferta e as especificações técnicas dos veículos é um passo importante para o planejamento e a implementação de projetos de eletromobilidade. Com os dados obtidos no estudo de mercado, é possível avançar para outras etapas, como a modelagem e a escolha de rotas que serão eletrificadas, a avaliação do custo total de propriedade dos veículos (TCO), o planejamento técnico e operacional da frota e a consolidação do modelo de negócios.

Para aproveitar a grande oportunidade da transição para frotas elétricas, o Brasil deve vencer outras barreiras, sobretudo institucionais e financeiras. No nível federal, é necessário articular incentivos fiscais alinhados a um plano nacional com diretrizes claras para estimular a transição. Nas esferas estadual e municipal, novos modelos de contrato de concessão também devem incluir metas e incentivos à eletromobilidade. Há boas experiências ocorrendo nos países vizinhos, onde é possível ver e aprender com os ônibus elétricos em operação.

A população brasileira quer mais ônibus elétricos em suas cidades. A transição é uma oportunidade de contribuir para a satisfação dos passageiros no momento em que o sistema de transporte coletivo enfrenta uma queda de demanda acentuada. Para tanto, deve ser parte de uma estratégia mais abrangente para melhorar a mobilidade urbana como um todo. O mercado efervescente é um dos elementos necessários para que a transição nas cidades brasileiras acelere.