Promover a restauração de paisagens e florestas trata de um processo de longo prazo e que busca incentivar a adoção de medidas baseando-se em análises das condições do solo, clima e outras variáveis a partir do ponto de vista funcional e produtivo. Os componentes físicos e ecológicos são importantes e essenciais no desenvolvimento de estratégias para dar escala à restauração, mas não são suficientes para responder à complexidade dos desafios em campo. O modo como as mulheres e os homens afetam e são afetados pelas políticas, programas, projetos e ações, por exemplo, é diferente.

Estudos apontam que a inclusão da abordagem de gênero e de diversidade pode aumentar significativamente a eficiência de um projeto de restauração, levando a ganhos, melhoria no desempenho, oportunidades iguais e maior participação. A intervenção humana, seja ela direta ou indireta, para promover a restauração passa pelo reconhecimento das diferentes visões e interesses, a dimensão humana.

O Grupo de Trabalho (GT) Gênero e Diversidade do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica tem buscado consolidar exemplos de iniciativas que comprovam a relevância de se trabalhar as questões de gênero e de raça de forma integrada. Dessa forma, alguns membros do GT elaboraram o capítulo “Equidade de Gênero e Diversidade”, presente no Relatório Temático sobre Restauração de Paisagens e Ecossistemas, que reuniu exemplos de atividades em andamento no Brasil, buscando ampliar a relevância da dimensão de gênero e de diversidade nos diferentes elos da cadeia de restauração.

Este repertório demonstra a existência de esforços internacionais que tratam a importância da dimensão de gênero em projetos de conservação e de restauração. Além disso, exemplifica as experiências brasileiras em diferentes biomas e estados que estão desenvolvendo práticas de restauração com finalidades diversas envolvendo a multiplicidade de pessoas beneficiárias dos produtos da floresta.

Um dos casos observados no relatório é o do estado do Espírito Santo, já conhecido por restaurar florestas para melhorar o abastecimento de água. Historicamente, a posse da terra é registrada sob o nome de homens e, caso não haja atenção específica sobre a temática, projetos socioambientais podem agravar a desigualdade de gênero. Dessa forma, um esforço específico no eixo do Programa Reflorestar, o Cooperar para Reflorestar, em seu primeiro ano de execução, organizou núcleos femininos de cooperativas rurais do estado visando transferir, de maneira mais diversificada, recursos destinados à restauração ecológica e implantação de modalidades de uso sustentável do solo por meio das assinaturas de contratos de pagamento por serviços ambientais (PSA). Iniciativas como essa têm papel importante na busca pela igualdade de gênero nos projetos de restauração, trazendo visibilidade às diversas oportunidades para mulheres e para homens na cadeia da restauração.

Mudança organizacional

O fato é que promover a abordagem de gênero em projetos de restauração passa por considerar necessidades desde o preparo e planejamento das ações e programas até o momento de elaborar recomendações e a implementação de projetos em si. E isso quer dizer trabalhar a mudança da cultura organizacional e políticas internas das instituições até o desenvolvimento de capacidade técnica nas equipes que lidam com a atividade em campo. Assim, é possível incorporar sistematicamente a abordagem nos processos de tomada de decisão e de definição de ações prioritárias, passando pelas estruturas e também pela integração programática.

O “Relatório Temático sobre Restauração de Paisagens e Ecossistemas”, que será lançado nesta sexta-feira (23) é resultado da parceria entre a Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) e o Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS) e apresenta uma visão sobre a agenda de restauração de paisagens e de ecossistemas no Brasil, englobando diferentes temas como escala, práticas de restauração nos diferentes biomas brasileiros, seus benefícios e os cenários de investimento e oportunidades, além de abordar questões sobre políticas públicas e governança, redes e movimentos e também abordagens que estão buscando promover a igualdade de gênero e de raça.