A transição global para uma economia verde poderia criar 18 milhões de empregos, com o potencial de gerar bons empregos e meios de subsistência em todo o mundo.

Mas e quanto às pessoas e comunidades cujos meios de vida dependem, neste momento, de combustíveis fósseis e setores de alto carbono?

Estima-se que 6 milhões de empregos na geração de eletricidade por carvão, extração de petróleo e outros setores podem desaparecer até 2030. Muitas das novas oportunidades de trabalho verdes exigirão habilidades diferentes das necessárias nos empregos anteriores ou estarão em novos locais.

Se uma transição complexa como essa não for conduzida de forma justa e equitativa, pode criar dificuldades desnecessárias para os trabalhadores e comunidades afetadas e até levar a retrocessos que podem desacelerar a implementação de políticas climáticas essenciais.

Então como deve ser uma transição justa?

O novo Centro de Recursos para uma Transição Justa e Ação Climática Equitativa do WRI destaca 31 iniciativas de diferentes partes do mundo que podem oferecer lições e aprendizados para assegurar que a transição para uma economia de zero carbono beneficie os trabalhadores e as comunidades.

Para ser bem-feita, uma transição justa exige diálogo e planejamento proativo entre trabalhadores, empregadores, governantes, comunidades e a sociedade civil. Essa articulação assegura que os custos e benefícios da ação climática sejam distribuídos de forma equilibrada e que as pessoas que atualmente dependem de atividades que fazem uso intenso de combustíveis fósseis recebam o apoio, a proteção social e os investimentos necessários para que possam prosperar em um futuro de zero carbono.

Também implica garantir que fluxos de receita relevantes recebidos pelos governos locais a partir da produção de combustíveis fósseis sejam substituídos de forma equitativa e que as empresas estejam aptas a gerar empregos dignos e crescimento econômico ao mesmo tempo em que contribuem para a ação climática.

Os exemplos apresentados no site mostram que transições justas e equitativas já estão acontecendo no mundo. Esses casos são uma inspiração para outras cidades, estados e países.

 

<p>Parque eólico Rampion Offshore, no Reino Unido</p>

 

Parque eólico Rampion Offshore, no Reino Unido. Os parques eólicos fornecem energia renovável, mas também exigem grandes áreas de terra. Estratégias para uma transição justa devem levar em consideração os direitos das comunidades locais e de acesso a terra (Foto: Nicholas Doherty/Unsplash)

 

 


Entre outras lições, esses exemplos nos oferecem quatro aprendizados:

1. Uma transição justa é possível.

Em Ruhr, região industrial da Alemanha, quase 70% dos 480 mil empregos em minas de carvão locais desapareceram entre 1955 e 1980. Apenas 3.371 desses empregos permaneciam ativos quando as duas últimas minas foram fechadas em 2018.

Uma mudança como essa poderia ter causado desemprego generalizado. Em vez disso, a média de crescimento econômico anual na região entre 1957 e 2000 foi modesta, mas positiva, de 1,3%, com taxas de desemprego relativamente baixas. Na metade da década de 2000, 100 mil trabalhadores foram empregados no setor de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias ambientais.

O sucesso econômico nesse caso foi construído ao longo de décadas de planejamento proativo que incluiu diálogo contínuo com sindicatos, amplos investimentos em infraestrutura para transportes e apoio à mão de obra, incluindo treinamentos e antecipação da aposentadoria. Hoje, Ruhr é uma região com alta concentração de universidades, além de ser reconhecida pela transformação de áreas anteriormente industriais em regiões residenciais modernas e locais atrativos para o turismo.

Esse sucesso em termos de planejamento proativo contrasta drasticamente com o que aconteceu na cidade de Wałbrzych, na Polônia, também uma área de mineração de carvão, onde o encerramento abrupto das atividades de quase todas as minas locais em decorrência de dificuldades econômicas em meados dos anos 1990 levou a uma taxa de desemprego de 40%. Isso aconteceu décadas antes que esforços de recuperação da economia – incluindo uma agência de desenvolvimento empresarial e a criação de uma zona econômica especial (INVEST-PARK) – fossem colocados em prática. Estima-se que a iniciativa INVEST-PARK tenha gerado entre 15.000 e 53.500 empregos em 2019-2020.

2. Diálogo com a sociedade é essencial.

Uma transição justa não será possível a não ser que todas as pessoas afetadas pela mudança – incluindo trabalhadores, empregadores e governantes – tenham a chance de defender seus interesses e participar plenamente do processo de planejamento.

Na Espanha, a Estratégia para a Transição Justa, criada em 2019, traça um processo participativo estruturado para garantir a proteção dos trabalhadores do setor de combustíveis fósseis do desemprego e planejar o futuro das áreas carboníferas. Até novembro de 2020, mais de 1.500 pessoas haviam participado dos debates e negociações que vão embasar Acordos para a Transição Justa em 14 regiões.

Embora a maior parte dos esforços da Espanha sejam focados nas minas de carvão, o encerramento planejado de usinas termelétricas a carvão eliminará 2.300 empregos, de acordo com dados do sindicato local. Em abril de 2020, dois ministros do governo alemão, dois sindicatos e os proprietários das usinas chegaram a um acordo que inclui o investimento em novas oportunidades de negócios, com base nos pontos fortes específicos das regiões afetadas, e o treinamento dos trabalhadores das usinas para que possam ser reempregados nessas novas oportunidades.

3. Estratégias para uma transição justa precisam abranger comunidades inteiras, não apenas os trabalhadores.

Dos trabalhadores de negócios locais que vendem produtos e serviços para empresas de combustíveis fósseis até os funcionários de mercados e cafés que atendem os trabalhadores desse setor e suas famílias, pessoas de toda a comunidade são impactadas quando uma grande indústria local encerra suas atividades. Além disso, os impostos pagos por empresas que fazem uso intensivo de combustíveis fósseis com frequência representam uma parcela significativa dos orçamentos públicos, financiando serviços essenciais como escolas e manutenção de estradas.

Quando a usina de carvão Huntley, de Tonawanda, no estado de Nova York, fechou em 2016 depois de onze anos de uma redução progressiva nas atividades, a arrecadação tributária na cidade, no condado e no distrito escolar caiu em US$ 6,2 milhões. Três escolas públicas foram fechadas.

Esse desafio reuniu uma coalizão diversificada que pressionou, com sucesso, o governo do estado de Nova York para criar, em 2016, o primeiro Fundo de Mitigação de Encerramento de Instalações de Geração Elétrica dos Estados Unidos, por meio do qual o governo estadual substitui até 80% da receita tributária local perdida em casos como o de Tonawanda. A coalizão também apoiou um processo de planejamento abrangente para o futuro econômico de Tonawanda.

4. Grandes projetos de energia limpa nem sempre são equitativos por padrão.

Empreendimentos de energia renovável, como parques para geração de energia solar e eólica, são importantes na transição, mas em geral exigem quantidades consideráveis de recursos, como grandes extensões de terra. Nesses casos, é crucial que a terra seja adquirida por meio de um processo que respeite os direitos das comunidades marginalizadas, como as pessoas de baixa renda ou comunidades indígenas.

Também é importante assegurar que a energia renovável crie oportunidades de trabalho acessíveis e de qualidade, principalmente considerando o fato de que grandes instalações como essas costumam ser construídas em áreas que concentram uma mão de obra relativamente pouco qualificada. Além disso, muitos países com alto potencial para a geração de energia renovável não contam com redes de segurança social e proteções suficientes nos locais de trabalho.

No Marrocos, uma grande usina de energia solar, de 7.143 acres e 582 megawatts, conhecida como Noor Power Station, foi construída seguindo medidas para gerar benefícios econômicos para as comunidades rurais de baixa renda próximas ao local da instalação. Essas medidas incluíram esforços proativos para promover o engajamento da comunidade, um plano de desenvolvimento social para melhorar a infraestrutura e os serviços, e a exigência de que a estação Noor compre 30% de sua matéria-prima, equipamentos básicos e componentes de fabricação de empresas locais. Os empregos mais acessíveis para os moradores da região – cargos que exigem baixa qualificação – representaram 46% das oportunidades de trabalho na construção e 21% das funções operacionais.

Experiências anteriores são fundamentais para projetar uma transição justa

Um mundo de zero carbono pode ser equitativo se for planejado de forma intencional para tanto. O Centro de Recursos para uma Transição Justa e Ação Climática Equitativa do WRI reúne exemplos de como o movimento em direção a economias de zero carbono pode beneficiar trabalhadores e comunidades; e nós acrescentaremos novos exemplos à medida que os esforços para a transição aumentarem.

O momento de planejar transições justas é agora. Os países estão atualmente em vias de submeter compromissos climáticos mais ambiciosos no âmbito do Acordo de Paris para a COP 26. Pacotes de estímulo estão sendo planejados para ajudar na recuperação econômica da pandemia de coronavírus. À medida que isso acontece, abre-se uma janela de oportunidade para acelerar a transição, abandonar os combustíveis fósseis, e construir um futuro de zero carbono que beneficie a todos.


Este blog foi publicado originalmente no Insights.