Este é o segundo de dois artigos escritos por Stefanie Tye e Juan-Carlos Altamirano. Foi publicado originalmente no WRI Insights. Leia o primeiro post aqui.

***

Não podemos prever o futuro, mas isso não significa que não podemos nos preparar.

Essa afirmação é particularmente verdadeira no que diz respeito às mudanças climáticas: sabemos que a atividade humana no planeta está modificando o clima, mas nem sempre temos certeza de onde ou como esse impacto vai se dar ou o quão severo será (leia o artigo anterior A incerteza das mudanças climáticas para uma visão mais ampla sobre a questão). No entanto, em vez de utilizar a incerteza como desculpa para não agir, gestores e tomadores de decisão precisam aceitá-la, incorporá-la nas tomadas de decisão e desenvolver os melhores planos possíveis para proteger comunidades vulneráveis a eventos naturais extremos.

Duas abordagens para navegar em mares incertos

Existem diferentes abordagens que permitem considerar o fator incerteza nas decisões de gestores e planejadores.

Entre as principais estão a abordagem que trata o problema pela ótica da resiliência e a que foca em adaptação. A primeira funciona bem para uma série de resultados esperados e envolve técnicas como a chamada Robust Decision Making (RDM;em tradução livre, “tomando decisões fortes”). RDM é uma metodologia analítica para planejadores que envolve duas etapas: primeiro, a decisão de agir, e, em seguida, a análise de modelos climáticos, dados socioeconômicos e demais informações relevantes para identificar a estratégia mais adequada para diferentes contextos futuros. Modelos de probabilidade RDM poderiam indicar, por exemplo, que uma seca intensa em determinada região pode durar de quatro a oito meses. De posse dessa informação, planejadores podem dar início às ações e preparativos necessários para os próximos seis meses e, assim, preparar a todos para diferentes cenários possíveis.

Já uma abordagem focada na adaptação é mais flexível. Normalmente, é uma resposta imediata a determinados eventos e que pode ser modificada conforme o desenrolar dos mesmos. Uma das técnicas dessa abordagem é o Interative Risk Management (em tradução livre, gerenciamento interativo de riscos), um método participativo que permite decisões flexíveis e reversíveis, mesmo quando os riscos não são claros. A técnica foi utilizada pelos planejadores envolvidos no projeto Thames Estuary 2100, como resposta à inundação catastrófica que atingiu a região em 1953, causando sérios prejuízos materiais e muitas mortes. Mais de um milhão de pessoas vivem na planície inundável do Tâmisa, uma área que compreende em torno de £200 bilhões em propriedades. Os planejadores, então, desenvolveram um sistema de barreiras móveis nas margens que podem ser levantadas ou abaixadas a qualquer momento, o que garante uma proteção flexível conforme o aumento do nível do ar e as cheias da maré.

Quatro considerações importantes para enfrentar efetivamente a incerteza

Independentemente da abordagem usada pelos tomadores de decisão, quatro fatores devem ser considerados:

Consciência.Antes de qualquer coisa, é importante reconhecer que a incerteza existe e aprender a se comunicar com os stakeholders. A incerteza pode ser difícil de perceber e medir, mas isso não significa que ela não esteja presente - nem justifica a falta de ação. A maioria das barragens nos Estados Unidos, por exemplo, estão ultrapassando os seus 50 anos de vida útil, e cerca de 17% das 87 mil barragens do país são consideradas "de alto risco" – se falharem, poderão gerar consequências catastróficas para as comunidades, rios e vida selvagem.

Pode haver incertezas sobre quando elas irão explodir, quais delas estão em maior risco, e quais serão os impactos, mas essas incertezas devem ser reconhecidas e, em seguida, enfrentadas de frente. Dessa forma os reparos podem ser priorizados ou, se evacuações forem necessárias, os afetados podem sofrer menos o choque da mudança e ter mais tempo para deixar a região de forma organizada. Assim como a ruptura da represa de Oroville, na Califórnia, nos mostrou em fevereiro passado, enterrar nossas cabeças na areia por não sabermos quando o desastre acontecerá não o impedirá de acontecer.

Flexibilidade. Muitas vezes é fundamental ter uma estratégia dinâmica e adaptável à medida que a situação muda, uma vez que isso é frequente quando se trata dos efeitos das mudanças climáticas. Ser capaz de responder rapidamente é primordial,  desde uma resposta que inclua evacuar calmamente milhares de pessoas para abrigos durante uma emergência, até aumentar uma barreira ou aumentar a taxa de drenagem de bombas de água conforme inundações fluviais ou de maré se intensifiquem.

Robustez. Qualquer estratégia climática eficaz deve ser capaz de suportar diferentes pressões sem rupturas. As redes de energia descentralizadas são uma boa forma de proteger contra as interrupções de fornecimento em grande escala causadas por um tornado ou outro evento meteorológico extremo. Os planejadores podem aconselhar os agricultores a diversificarem seus meios de subsistência o máximo possível para resistir às perdas de renda e alimentos em um ano de safra ruim, uma seca prolongada ou inundações graves. Captar receitas da pesca, artesanato e outros serviços não agrícolas poderia ajudar a amortecer uma crise financeira e aumentar a resiliência.

Contexto. A adaptação às mudanças climáticas é, em última instância, local e depende da realidade, circunstâncias, normas culturais, perspectivas e recursos locais. Não há uma única solução para todos. Os países da África Ocidental, por exemplo, ainda não têm a capacidade tecnológica e os recursos financeiros para projetar e disseminar culturas resistentes à seca como têm os países europeus ou os mais ricos. Os tomadores de decisão poderiam, portanto, ficar mais satisfeitos ao promover sistemas agroflorestais, empreendimentos mais resilientes, menos custosos e mais bem-sucedidos para lidar neste contexto com o futuro incerto das mudanças climáticas e climáticas. As estratégias de mitigação também podem ser altamente dependentes do contexto. Para uma nação pode ser melhor reduzir emissões através do reflorestamento ou infraestrutura verde, enquanto outra pode escolher sistemas de "limitação e negociação" ou investir em energias renováveis.

A melhor maneira de gerenciar e compreender a incerteza nas tomadas de decisão ainda está em evolução – ainda há pesquisas a serem feitas. No entanto, a incerteza das mudanças climáticas é uma realidade que não podemos ignorar. Os tomadores de decisão não podem esperar por informações perfeitas. Em vez disso, eles precisam lidar com o que sabem e formular o melhor plano possível usando todas as ferramentas à sua disposição.