A região metropolitana de São Paulo enfrentou uma crise hídrica severa em 2014-2015. Essa crise, no entanto, pode se repetir: com os efeitos das mudanças climáticas, o clima de São Paulo pode ficar ainda mais extremo, com enchentes e secas se revezando e comprometendo o abastecimento.

A principal estratégia para lidar com essas crises tem sido o investimento em infraestrutura convencional, como a construção de canais e reservatórios. Uma série de estudos vêm mostrando que essas obras têm muito a ganhar se, junto com elas, os tomadores de decisão investirem também em infraestrutura natural, como as florestas. Um relatório publicado nesta terça-feira (25) calculou quanto custa investir em plantar florestas na bacia do Cantareira e qual seria o benefício desse investimento, mostrando que a restauração florestal pode ser uma boa estratégia para enfrentar crises e melhorar a qualidade da água de São Paulo. Não só isso: o estudo mostra que plantar florestas também faz sentido do ponto de vista econômico.

A abordagem inovadora do estudo “Infraestrutura Natural no Sistema Hídrico de São Paulo” foi fazer para a infraestrutura natural os mesmos cálculos que empresas de saneamento fazem quando querem saber o retorno de seus investimentos em obras de infraestrutura convencional. Para fazer isso, o relatório olhou para um horizonte de 30 anos, o mesmo usado para obras como criação de reservatórios, aplicou taxas de desconto para calcular a inflação e o risco financeiro, e avaliou custos, despesas e lucros, como manda qualquer bom projeto convencional.

O resultado foi surpreendente. Segundo o estudo, a restauração de 4 mil hectares de florestas em áreas prioritárias na bacia do Cantareira consegue reduzir em até 36% o aporte de sedimentos, como sujeira e terra, nos rios que correm para os reservatórios. Com menos sedimentos entrando nos reservatórios, a empresa de saneamento gasta menos com a limpeza da água. Não são necessárias tantas operações de dragagem nos rios, por exemplo, e a empresa pode usar uma quantidade menor de produtos químicos para tratar a água. Ao longo de trinta anos, essa redução de gastos representa uma economia de US$ 69 milhões - ou, na linguagem dos investidores, um retorno de investimento de 28%, compatível com obras de infraestrutura tradicional do setor de abastecimento.

O trabalho foi desenvolvido pelo WRI Brasil e pelo escritório internacional do WRI, em parceria com a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, The Nature Conservancy (TNC), Fundação FEMSA, União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), Instituto BioAtlântica (IBio) e Natural Capital Coalition.

<p>Área de pastagem na bacia do Sistema Cantareira</p>

Pastagem degradada na região do Cantareira. A restauração de 4 mil hectares prioritários em locais onde hoje são pastagens pode melhorar a qualidade da água em São Paulo (Foto: Erik Lopes/TNC

Benefícios reais para a sociedade

O relatório analisou apenas um benefício da restauração de florestas - o quanto ela melhora a qualidade da água que será abastecida nos grandes centros. Mas plantar florestas gera outros inúmeros serviços para a população. Por exemplo, as florestas têm papel importante em mitigar e minimizar os efeitos das mudanças climáticas. Árvores sequestram carbono da atmosfera, contribuindo na redução da concentração de gases de efeito estufa e, portanto, limitando o aquecimento global. Além disso, são uma estratégia eficiente para adaptação a um clima mais extremos, já que os ambientes naturais tornam o sistema de abastecimento de água mais seguro e resiliente. Isso sem falar em outros serviços ambientais, como conservação da biodiversidade ou a melhora da qualidade do ar.

Esses benefícios estão tão evidentes que 45 cidades do mundo se uniram na iniciativa Cities4Forests, comprometendo-se a proteger, gerenciar e restaurar florestas em três escalas: florestas internas, próximas e distantes. São Paulo é uma dessas cidades.

Cálculos para outras cidades

A metodologia usada para a Cantareira, chamada “Análise de investimentos em infraestrutura natural”, já foi aplicada em outras cidades do mundo, especialmente nos Estados Unidos, como Denver e Portland. No Brasil, no entanto, ela é inédita. Os próximos passos é aplicar o método em outros sistemas de abastecimento. O WRI Brasil publicará, nos próximos meses, análises como essa para os sistemas de abastecimento do Rio de Janeiro e de Vitória.

O uso dessas análise pode ajudar empresas de saneamento e tomadores de decisão a melhor planejar os sistemas de abastecimento. Mesclando infraestruturas natural e convencional, é possível abastecer os grandes centros urbanos, reduzir custos e conservar florestas.