Este blog foi escrito por Taryn Fransen, Noëmie Leprince-Ringuet, Aishwarya Ramani e Ichiro Sato e publicado originalmente no Insights.


Em todos os anos da última década, cientistas se reuniram para medir a diferença entre as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e as promessas climáticas atuais dos países e como elas deveriam ser para limitar o aquecimento global nos níveis especificados no Acordo de Paris. Semanas atrás esses mesmos cientistas anunciaram, mais uma vez, que mesmo com um aumento dos esforços para combater as mudanças climáticas, a diferença aumentou.

Sob as atuais promessas climáticas atuais – as contribuições nacionalmente determinadas (NDCs) –, o planeta está caminhando para aquecer 3,2°C, com consequências desastrosas para os meios de subsistência e para os ecossistemas. O processo de aprimoramento das NDCs 2020 é um momento para os países avaliarem o nível de ambição de suas NDCs atuais e decidirem quais metas podem ser definidas ou revisadas para refletir as novas opções possíveis. Até o momento, 68 países – principalmente pequenos emissores – indicaram que cumprirão o prometido.

Em um novo conjunto de orientações, o WRI e seus parceiros analisaram as oportunidades para os países avançarem suas NDCs com ações nos quatro setores com maiores emissões: energia, transporte, florestas e agricultura. Esses setores representam coletivamente 63% das emissões globais. Além de apontar os países em uma direção correta para transformar setores específicos, essas oportunidades também podem facilitar a definição de metas mais ambiciosas em toda a economia.

Energia: queda nos custos de fontes renováveis e novos avanços para descarbonizar o setor

O setor de energia é a maior fonte de emissões de CO2. A descarbonização do setor – que pode ser feita enquanto se amplia a aquisição de energia acessível e confiável, essencial para elevar os padrões de vida – oferece vários cobenefícios, incluindo geração de emprego, melhor acesso à energia, desenvolvimento econômico e social, menor estresse hídrico e maior resiliência.

A redução de custos com tecnologia, a modernização da rede e os novos modelos de negócio abriram oportunidades para transformar os sistemas de energia de maneiras que pareciam improváveis até cinco anos atrás. Para proporcionar a transição do setor de energia, os países precisarão usar seus NDCs para avançar estratégias organizacionais, incluindo maior flexibilidade da rede, planos para lidar com os ativos existentes de combustíveis fósseis e integração de setores de uso final como edifícios e transportes no setor de energia.

O aprimoramento da NDC pode refletir os seguintes elementos:

  • Capacidade de energia renovável e metas de geração, incluindo metas de energias renováveis distribuídas que podem permitir o acesso à energia.
  • Metas e políticas de melhoria da rede em paralelo à implementação de energia renovável, incluindo metas para armazenamento de energia que possam reforçar a inserção de fontes renováveis.
  • Políticas e metas para explorar sinergias entre o setor de energia e os setores de uso final, como metas de eletrificação ou eficiência para uso de energia em edifícios e na indústria.
  • Compromissos para acabar com subsídios ineficientes de combustíveis fósseis, acompanhados de uma transição justa em direção à eliminação gradual do carvão.

Transporte: aumento da eletrificação dos veículos, promoção do transporte coletivo e avanço do frete limpo

Com o aumento da demanda, projeta-se que as emissões de transporte sejam de três a seis vezes maiores que os níveis compatíveis com o Acordo de Paris até a metade deste século. Transformar o transporte por meio das NDCs é fundamental. As principais oportunidades incluem:

  • Eletrificação do transporte e metas de veículos com emissão zero que aproveitem as oportunidades oferecidas pela redução dos custos da bateria e de uma rede mais limpa.
  • Metas para construir infraestrutura para ônibus e modos ativos assim como incentivar a alteração do modo de transporte individual para transporte coletivo, bicicleta e caminhada.
  • Metas e políticas para abordar o setor de frete (que responde por 40% das emissões globais de transporte), incluindo o avanço da eletrificação e combustíveis limpos, bem como a eficiência logística e operacional.

Florestas: armazenamento de carbono e proteção aos meios de subsistência

As florestas e o uso da terra representam cerca de 10% das emissões líquidas de gases de efeito estufa – com um gerenciamento adequado, o setor pode se transformar de uma fonte de emissão a um sumidouro de carbono. O setor também oferece opções econômicas de remoção de carbono que podem ser implantadas em escala. O aprimoramento dos serviços dos ecossistemas florestais fornecem cobenefícios de adaptação e desenvolvimento, essenciais para populações vulneráveis cuja dependência dos sistemas florestais é mais alta. As principais oportunidades de aprimoramento das NDCs incluem:

  • Metas para conservação ou redução do desmatamento. Isso pode ser acompanhado por medidas que promovam áreas protegidas, pagamentos por serviços ambientais e reforma na posse da terra.
  • Metas focadas em tipos específicos de florestas, como florestas primárias ou manguezais e turfeiras.
  • Metas de reflorestamento e restauração. Isso pode ser acompanhado por um investimento público em reflorestamento e programa sustentável de certificação de produtos florestais.

Agricultura: promoção da segurança alimentar

As mudanças climáticas já estão afetando a produção de alimentos em muitas regiões, devido a perdas de colheitas e à diminuição das oportunidades de emprego. É provável que esses impactos se tornem cada vez mais graves até 2030, colocando em risco a segurança alimentar global e os meios de subsistência de centenas de milhões de pessoas. A agricultura também é a segunda maior fonte de emissões de GEE.

Apesar dos desafios, existem enormes oportunidades para promover práticas agrícolas produtivas, resilientes e inclusivas, que também trazem benefícios de adaptação e mitigação. Por exemplo, aumentar a produção agrícola e pecuária por meio da intensificação sustentável pode reduzir as emissões por unidade de alimento produzido e aliviar bastante a pressão sobre as florestas remanescentes no mundo. E o consumo pode ser mais eficiente, reduzindo a perda e o desperdício de alimentos e através da mudança para dietas mais saudáveis e sustentáveis nos países mais ricos.

Embora mais de 90% das NDCs mencionem a agricultura, a próxima rodada de atualizações permite que os países adotem plenamente todas as oportunidades relevantes, incluindo:

  • Metas e políticas para uma melhor gestão das culturas, tais como metas para reduzir as emissões de metano através de práticas aprimoradas de gestão das culturas de arroz.
  • Metas e políticas para uma melhor gestão da terra, como reduzir ou eliminar o uso de fogo em terras agrícolas.
  • Metas e políticas para medidas mais sustentáveis de produção e consumo, como metas específicas de perda de alimentos e redução de resíduos.
  • Políticas para tornar o setor agrícola mais equitativo e resiliente, como extensão da agricultura aprimorada, alocação de recursos para mulheres pequenas agricultoras e aprimoramento de redes de segurança social para proteger os agricultores.

O próximo ano é crucial

Em 2020, os países terão a primeira oportunidade de atualizar suas metas após o Acordo de Paris. Aumentar essa ambição é vital para garantir que o objetivo do Acordo seja alcançado. Com a queda dos custos de tecnologia e um maior entendimento de medidas políticas sustentáveis, a capacidade de agir aumentou significativamente de quando os países enviaram suas NDCs iniciais. A adoção de ações transformadoras nos quatro setores acima permitirá que os países fortaleçam seus compromissos climáticos, promovendo o desenvolvimento sustentável e equitativo. Para diminuir o déficit de emissões, é necessário que as maiores economias do mundo e os principais emissores, em particular, partam para a ação.