Este blog foi publicado originalmente no WRI Insights.


Uma cidade é um lugar difícil para uma árvore sobreviver. Em comparação a suas companheiras de áreas rurais, as árvores urbanas em geral recebem menos água e calor mais intenso, competem por espaço com outras infraestruturas e frequentemente sofrem com doenças e pragas. Como resultado, muitas cidades se veem com várias árvores mortas todos os anos.

Em geral, as árvores são cortadas e transformadas em lenha ou adubo ou transportadas para os aterros sanitários. Com frequência, as cidades replantam menos ávores do que removem, levando a uma perda na cobertura vegetal ao longo do tempo.

Mas essas árvores não precisam se tornar lixo. Os “hubs” ou centros de reflorestamento são um modelo promissor que pode evitar que as árvores acabem nos aterros. E fazem isso encontrando novos usos para elas, como o reaproveitamento da madeira para móveis ou pisos. Esse movimento pode ajudar as cidades a lidar com as árvores mortas e, ao mesmo tempo, gerar renda, criar novos empregos, ajudar a cumprir metas de saúde de longo prazo e mitigar as mudanças climáticas.

A oportunidade da madeira urbana

A restauração nos Estados Unidos oferece benefícios consideráveis tanto para o clima quanto para as comunidades. A escala dessa oportunidade é surpreendente: apenas nos EUA, diferentes paisagens podem abrigar 60 bilhões de novas árvores. Essa quantidade de árvores poderia sequestrar até 540 milhões de toneladas de CO2 por ano – o equivalente a substituir 117 milhões de carros movidos a gasolina por veículos elétricos alimentados por fontes de eletricidade limpa. Desse total, em torno de 400 milhões de árvores poderiam ser plantadas nas cidades. Para aproveitar essa oportunidade, são necessários recursos financeiros e uma união de esforços de diversas entidades públicas e privadas.

árvores na cidade Cidades nos Estados Unidos podem plantar até 400 milhões de árvores e se tornar um importante agente no movimento da restauração. (Foto: Vladimir Kudinov/Unsplash)

Enquanto esperam por verbas do governo ou que o setor privado voluntariamente ofereça financiamento em uma escala significativa, as cidades nos Estados Unidos na verdade detêm elas próprias um importante e inexplorado recurso – que, no entanto, tem sido literalmente desperdiçado.

A cada ano, 36 milhões de árvores caem nas cidades americanas devido à idade avançada, doenças ou à implementação de novas infraestruturas, resultando em um prejuízo de até US$ 786 milhões por ano. Grande parte dessa madeira poderia ser reaproveitada em novos produtos, mas, em vez disso, costuma ser partida, jogada em aterros ou utilizada como lenha. Repensar os resíduos de madeira urbana pode ser uma solução climática econômica e inesperada, capaz de transformar um fardo para o clima e para os recursos públicos em um catalisador do reflorestamento.

Esta oportunidade foi a inspiração para o conceito dos “centros de reflorestamento”, concebido por Cambium Carbon, Cities4Forests e Arbor Day Foundation. Juntas, as entidades trabalharão em parceria com autoridades municipais para criar, até 2022, os primeiros centros de reflorestamento dos Estados Unidos, com recursos de um programa de doações da TNC chamado Natural Climate Change Solutions Accelerator (em português, Acelerador de Soluções Naturais para as Mudanças Climáticas).

O que é um centro de reflorestamento?

No formato mais simples, os centros de reflorestamento são parcerias público-privadas que geram economia para as cidades e receita para plantar e manter mais árvores, evitando que as árvores que morrem ou caem nas cidades acabem nos aterros. Em vez de ir para o lixo, as árvores são classificadas e reaproveitadas conforme o melhor uso, como móveis, madeira laminada cruzada, madeira serrada, pisos, composto ou adubo. O reaproveitamento economiza dinheiro para a administração municipal e gera receita para plantar e manter mais árvores, alimentando uma economia circular vibrante e permitindo que as cidades combatam as mudanças climáticas de forma mais eficiente. No processo, os centros também contribuem para a saúde pública e para o crescimento econômico, criando empregos em infraestrutura verde como fábricas, viveiros e novas iniciativas de plantio.

Gráfico sobre restauração de árvores urbanas

Apesar do valor que a madeira urbana pode ter, ainda há obstáculos importantes no caminho de seu uso. Falta infraestrutura nas cidades para fazer com que as árvores que caem continuem tendo valor, e as cadeias de produção do setor não são estruturadas em torno de produtos provenientes de madeira urbana. Considerar essas duas lacunas é a primeira etapa para a criação de um centro de reflorestamento funcional. Para fazer isso, são necessários investimentos em pátios para armazenamento e classificação da madeira e infraestrutura de moagem para processar os resíduos recebidos, reunindo autoridades municipais, moleiros urbanos, artesãos, fabricantes de móveis, instalações de biochar (carvão vegetal utilizado no solo) e operações de compostagem. Além disso, é preciso estabelecer cadeias de valor que conectem esses ecossistemas de madeira urbana ao mercado mais amplo.

Empreendedores do setor estão tentando romper com essa visão, mas a um progresso lento. Construir um centro de reflorestamento exige uma colaboração de grandes proporções, e a madeira urbana é uma matéria-prima complexa com a qual se construir cadeias de fornecimento. Os centros de reflorestamento transpõem essa barreira ao aliar quatro ingredientes:

  1. Compromissos em escala municipal para obter a madeira a partir de agências municipais e empreiteiras, comprar madeira urbana para operações municipais e estabelecer planos de plantio de longo prazo.
  2. Financiamento privado de instituições filantrópicas e investidores de impacto para a infraestrutura necessária.
  3. Uma plataforma de incubação de mercado que fomenta a conscientização dos consumidores e proporciona a tecnologia para conectar compradores e vendedores.
  4. Uma missão de impacto social que reinveste os lucros da nova economia da madeira no plantio de árvores nas cidades e paisagens do entorno.

Essa visão tem como base o trabalho do Baltimore Wood Project, que cria móveis e outros produtos de alto valor a partir de árvores urbanas mortas e madeira recuperada de casas em demolição. A cidade de Baltimore criou uma rede de fornecedores e compradores de madeira recuperada e investiu pesado em Camp Small, um pátio de classificação capaz de processar o fluxo de árvores mortas da cidade e transformá-las em produtos de valor novamente.

Novas oportunidades para as árvores urbanas

Os centros de reflorestamento não agregam valor apenas reutilizando árvores mortas, mas também abrindo um caminho para o plantio de novas árvores nas cidades. É um movimento que traz uma série de benefícios para a saúde, incluindo a purificação do ar e da água e a redução de doenças respiratórias e do calor. As árvores também aumentam a retenção das águas pluviais, aliviando o impacto nos sistemas de esgoto da cidade.

Gráfico sobre benefícios da restauração de árvores urbanas

A cobertura vegetal costuma seguir parâmetros raciais e de renda nas cidades, privando as comunidades desfavorecidas de seus benefícios. Ao aplicar princípios de “equidade de árvores” ou “equidade vegetal”, os centros de reflorestamento podem oferecer recursos para plantar mais árvores e melhorar a saúde das que já existem e, com isso, beneficiar essas comunidades. Também podem gerar novas oportunidades de trabalho por meio dos mercados criados para a madeira urbana reutilizada.

Aproveitando ao máximo as árvores caídas

Apesar dos muitos benefícios proporcionados pela vegetação urbana, com as restrições econômicas causadas pela pandemia de Covid-19, as cidades podem ser pressionadas a adiar a manutenção e o replantio de árvores. Em compensação, o reflorestamento bem planejado tem o potencial de melhorar as condições respiratórias dos moradores, e o aumento da cobertura vegetal pode ajudar as cidades a cumprirem suas metas climáticas. Os centros de reflorestamento oferecem inúmeros benefícios, gerando novas fontes de receita para a manutenção e o plantio de árvores, além de criar um caminho para o financiamento de um trabalho mais amplo com as árvores nas cidades. Como resultado, essas instalações têm o potencial de se tornarem uma benção econômica, climática e para a saúde nas cidades diante de crises que se misturam uma às outras.