Os 3,5 milhões de habitantes do Espírito Santo dependem hoje de mananciais de abastecimento em grande parte degradados, o que gera um risco crescente de desabastecimento. O estado se vê diante da necessidade de investir na restauração florestal para recuperar sua infraestrutura natural e a disponibilidade hídrica, como uma das medidas para evitar que a crise se agrave. E, para identificar as áreas com maior potencial, aplicou a ROAM – Metodologia de Avaliação de Oportunidades de Restauração.

Ao longo dos anos, mudanças no uso da terra levaram à perda significativa da cobertura florestal no Espírito Santo, com impactos associados à crise hídrica, degradação dos solos e perda de biodiversidade que, direta ou indiretamente, afetam também a qualidade de vida da população. Esses impactos prejudicam a capacidade produtiva rural, dificultam novos investimentos financeiros e comprometem o abastecimento público de água.

Em 2015, a Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh) acionou o alerta para a situação dos mananciais. As bacias hidrográficas com maiores necessidades de ações de restauração são as de São Mateus e Itaúnas, ambas localizadas na porção norte do estado, região que apresenta também os menores índices de cobertura florestal natural encontrada. O alerta desencadeou uma série de medidas para reduzir o consumo de água, mas também evidenciou a urgência de promover a restauração florestal como instrumento de infraestrutura hídrica do Estado.

ROAM: produtores locais querem restaurar para melhorar a água

A metodologia da ROAM permite identificar oportunidades, analisar dados e promover a restauração de paisagens e florestas. No caso do Espírito Santo, as motivações estavam relacionadas a aumentar a cobertura florestal e promover a segurança hídrica, atendendo à legislação ambiental vigente. Para isso, parte de uma abordagem participativa. O objetivo é articular os principais atores interessados na restauração a fim de entender suas necessidades, desafios, interesses e motivações que podem variar de região para região.

A metodologia identificou as oportunidades de restauração relacionadas à contenção de sedimentos e erosão com o melhor custo-benefício para a restauração, como as áreas de nascentes ou margens de rios. As bacias de São Mateus e Itaúnas também foram as que apresentaram maior área disponível para restauração, com mais hectares disponíveis (17 mil e 11 mil, respectivamente).

Um dos modelos avaliados pela ROAM associa o plantio de espécies nativas com eucalipto (Foto: Fábio Pozzebom/ABr)

Com base nos resultados, foram propostos modelos alternativos de restauração para aumentar a renda das famílias rurais. A partir dos cenários de restauração testados com a ROAM, foi possível verificar o potencial de redução dos sedimentos nos cursos d’água. Essa diminuição afeta positivamente a qualidade da água e tem consequências diretas na economia financeira do estado com o tratamento, já que a água chega aos reservatórios mais limpa.

Entre outras recomendações, a aplicação da ROAM apontou a necessidade de identificar investidores para restauração com finalidade econômica e desenvolver e consolidar modelos agroflorestais adaptados às diferentes regiões do estado, conforme as áreas priorizadas.

Recuperar 80 mil hectares até 2020

Os locais com maior potencial de restauração foram selecionados também com base no Programa Reflorestar, do governo estadual, que tem a meta de recuperar 80 mil hectares até 2020. Para atingir a meta, o programa trabalha com pagamento por serviços ambientais (PSA) e o plantio de florestas tanto com fins conservacionistas quanto conciliando a proteção do solo e da água com a geração de emprego e renda para os produtores rurais.

O estado disponibiliza recursos financeiros e técnicos aos proprietários, além de monitorar a implantação dos projetos técnicos e a evolução do aumento da cobertura florestal. Atualmente, são mais de oito mil produtores cadastrados – três mil deles já participantes ativos do programa, com PSA e ações de restauração em andamento em suas propriedades. Até aqui, o programa já registra mais de 8 mil hectares em processo de restauração por meio de PSA, além das áreas em regeneração, também monitoradas pelo programa, que somam cerca de 285 mil hectares.

O Reflorestar oferece o PSA em seis modelos de restauração:

  • Floresta em pé: pagamento para florestas conservadas e elegíveis para essa modalidade

  • Regeneração natural: apoio para promover o isolamento de áreas para recuperação natural e pagamento pelos serviços ambientais gerados

  • Recuperação com plantio: insumos para o plantio de mudas de espécies nativas da Mata Atlântica e pagamento pelos serviços ambientais

  • Sistemas Agroflorestais: sistemas que combinam espécies florestais com culturas agrícolas, como café, milho e mandioca

  • Sistema Silvipastoris: sistemas que combinam árvores com pastagens

  • Floresta manejada: insumos para a implantação de culturas florestais para o manejo florestal (sem corte raso)

Conforme explica Marcos Sossai, coordenador do Reflorestar, além de distintos entre si, os modelos variam de área para área, de modo que é difícil apontar um principal. Cada um será mais ou menos eficiente dependendo das características de cada área e das necessidades em cada local. “Temos vários modelos com fins econômicos, por exemplo. E atualmente as áreas com plantio de florestas com fins econômicos superam aquelas que visam somente a conservação. Os resultados vêm em médio e longo prazo e precisam ser monitorados. Com certeza há produtores que já notam mudanças, mas ainda precisamos desenvolver uma metodologia para medir impactos com mais precisão”, avalia Sossai.

A restauração de paisagens florestais pode contribuir para a manutenção dos recursos hídricos tanto para o abastecimento humano quanto para a agricultura e possibilita uma fonte de renda adicional através da exploração dos recursos madeireiros e não madeireiros das áreas em processo de restauração.

Além da aplicação da metodologia ROAM, que ajudou a identificar oportunidades de restauração no estado, o WRI Brasil também ajudou a desenvolver no Espírito Santo um terceiro estudo de caso de infraestrutura natural para água. Como já realizado no sistema Cantareira, em São Paulo, e no sistema Guandu, no Rio de Janeiro, a análise mostrará como a conservação e restauração de áreas verdes podem ter um papel de infraestrutura para o abastecimento de água.