Historicamente, agricultura e florestas não andavam juntas. Para produzir alimentos, o mais comum era derrubar árvores, reduzindo toda a diversidade de uma área com muitas espécies para apenas uma: a espécie que seria produzida numa lavoura.

Essa separação entre a produção de alimentos e o meio natural, porém, teve alguns resultados problemáticos, como a degradação do solo e da água. Hoje, sabemos que é possível produzir alimentos mantendo uma área de cobertura florestal e diversidade de espécies. Como? Com os Sistemas Agroflorestais (SAFs).

Este é o segundo de três artigos sobre novas tecnologias agropecuárias para renovar as paisagens degradadas do Brasil. Essas tecnologias estão sendo aplicadas na bacia do Rio Doce, através de uma parceria entre a Fundação Renova, o WRI Brasil, a Fazenda Ecológica e o Centro Internacional de Pesquisa Agroflorestal (ICRAF).

No primeiro texto, explicamos o manejo de pastagem ecológica. Agora, mostramos como os sistemas agroflorestais podem restaurar áreas degradadas, aumentar a produção de alimentos e gerar renda para os produtores rurais atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG).

Acelerar o que acontece na natureza

O Sistema Agroflorestal pode ser explicado de forma simples: trata-se de um modelo onde há mistura entre floresta e lavoura na mesma área. Ao preparar sua produção, o agricultor não irá cultivar apenas uma ou poucas espécies. Em vez disso, ele organizará uma produção com muitas espécies, em um desenho em que cada uma cumpre uma função ecológica e também econômica, considerando tempo e espaço, além da interação entre as espécies de forma que uma ajude a outra a crescer e produzir.

São vários os tipos de SAFs possíveis. Um tipo comum na região é o do consórcio de árvores frutíferas com culturas anuais como o milho, cana e mandioca. O produtor pode plantar espécies como jabuticaba, banana, acerola e copaíba na lavoura, mantendo uma cobertura florestal e contribuindo com sua renda ao possibilitar a venda de mais produtos como frutas, sementes, óleos etc.

Os Sistemas Agroflorestais buscam quebrar a lógica de separação entre agricultura e floresta. Eles mostram que é possível trabalhar em um sistema integrado que tenha maior diversidade de espécies, buscando se aproximar de uma floresta, e ao mesmo tempo tenha a função de produzir alimentos. Tudo isso sob o controle do trabalho de homens e mulheres, ao otimizar as interações entre as espécies no tempo e no espaço.

Nos SAFs, o produtor vai assumir o papel de acelerar o que acontece na natureza. Árvores caem e morrem naturalmente em uma floresta, assim como outras nascem. Da mesma forma, o produtor vai plantar árvores e retirar outras. Vai fazer carpinas seletivas, plantios e podas, acelerando processos que já acontecem na natureza, mas de forma a gerar o melhor benefício pensando em produção econômica e manutenção de funções ecológicas nas áreas.

Experiência do produtor em prol do planeta

Na bacia do Rio Doce, o ICRAF está implementando, em parceria com o WRI Brasil e com agricultores e agricultoras familiares, cinco unidades demonstrativas de sistemas agroflorestais, somando aproximadamente três hectares.

Não seria possível fazer o trabalho sem estar lado a lado e escutar a experiência das famílias. O desenho do sistema agroflorestal – quais espécies serão usadas, como elas serão dispostas na área – precisa responder não só a questões técnicas, como a função de cada espécies no meio ambiente, mas também a questões sociais que respondam aos anseios das pessoas envolvidas. São levados em conta pontos importantes como: quais as espécies de maior interesse na região, quais podem ser comercializadas ou quais serão utilizadas pela família na alimentação ou na manutenção da propriedade, entre outros.

O engajamento e a participação das famílias envolvidas é crucial para o sucesso de se implantar uma nova tecnologia agroflorestal. São elas que vão cultivar e manejar o sistema agroflorestal, e é para elas que o sistema tem que servir. Só atendendo os interesses da população local é que os SAFs vingarão e, assim, poderão ajudar o planeta, capturando carbono da atmosfera, restaurando solos degradados, aumentando a diversidade e a segurança alimentar da região e criando as condições para dar escala a uma restauração que seja boa tanto do ponto de vista ambiental quanto social e econômico.

 

Saiba mais na página do projeto Renovando Paisagem.