Com um smartphone em mãos, é fácil saber onde estamos ou descobrir para onde queremos ir. Em muitas cidades, porém, nem mesmo o onisciente Google Maps é capaz de informar como se deslocar de um ponto a outro usando o transporte coletivo. A solução para esse problema é uma tecnologia de sigla curta e com potencial de transformação a perder de vista: o GTFS.

Se você não sabe o que é General Transit Feed System (o GTFS), não se sinta desinformado: muitas cidades ainda engatinham na disponibilização de dados sobre o transporte coletivo. A menos que se esteja em um centro urbano onde Google Transit, Moovit, CittaMobi ou outras ferramentas de planejamento de viagem são operacionais – todas funcionam com base no GTFS –, planejar deslocamentos em transporte coletivo significa pesquisar as linhas disponíveis em páginas de internet pouco intuitivas, percorrer tabelas horárias estáticas na esperança de que sejam cumpridas com alguma pontualidade e, quando o trajeto depende de mais do que apenas um ônibus, montar sozinho o quebra-cabeças difícil de encaixar.


O GTFS é um protocolo padronizado para o fornecimento de dados georreferenciados sobre o transporte coletivo. O Google criou o padrão em 2006 para que, ao pesquisar uma rota no Google Maps, as pessoas conhecessem as opções de transporte coletivo disponíveis e a estimativa de duração de viagem para cada combinação disponível de linhas e com outros meios de transporte. Por conter os horários que cada veículo chega e parte de cada ponto, estação ou terminal, o GTFS viabiliza o planejamento mais preciso e intuitivo, mesmo dos deslocamentos mais complexos.

Mais de 630 cidades e 1200 órgãos e empresas operadoras do transporte coletivo de todo o mundo já empregam esse formato para fornecer dados abertos sobre rotas, pontos de ônibus, estações, terminais, tarifas e tabelas horárias do transporte coletivo. Se disponibilizados abertamente, os dados servem de insumo para que softwares e ferramentas diversas os transformem em serviço para os passageiros, acelerando soluções para o difícil desafio de tornar o transporte coletivo mais atraente e efetivo.

Dados abertos para fomentar inovação

No Brasil, o cenário do GTFS é bastante heterogêneo. Em uma ponta estão cidades que ainda informam itinerários em tabelas precárias e não integradas. Na outra extremidade, estão cidades que adotaram o GTFS e disponibilizam esses dados abertamente, como Belo Horizonte, Porto Alegre e São Paulo. No meio disso, estão boa parte das cidades brasileiras: existe a intenção de melhorar a experiência dos passageiros, mas faltam esforços ou condições para garantir o aporte dos dados em GTFS e o comprometimento com a transparência para abertura dessas informações, às vezes, de posse apenas dos operadores de ônibus.

Além de atender ao interesse público, a abertura desses dados é fonte de conhecimento e combustível para a inovação. Permite que vários desenvolvedores criem soluções de mobilidade em uma mesma cidade – há cidades no mundo em que dezenas de apps concorrem para oferecer a melhor experiência para as pessoas.

Mais do que isso: porque os dados são padronizados, as soluções criadas são universais. Um app europeu pode vir a beneficiar passageiros do transporte coletivo na América do Sul ou na África, por exemplo.

Desde que foi criado, o GTFS serviu de base para outros protocolos, incluindo o GTFS Realtime, atualizado em tempo real de acordo com intercorrências como atrasos ou acidentes que impactem a prestação dos serviços, e o General Bikeshare Feeding System (GBFS), que se baseia no padrão criado pela Google para fornecer dados sobre compartilhamento de bicicletas.

A adoção de protocolos padronizados como esses nos diferentes meios de transporte disponíveis nas cidades é um dos passos rumo à Mobilidade como um Serviço. Enquanto o futuro da mobilidade não chega, é um recurso já disponível para melhorar a experiência de quem usa o transporte coletivo, contribuindo para o fortalecimento do sistema.

Fonte de informação sobre acessibilidade

O GTFS também tem se revelado um instrumento poderoso para a obtenção de informações para embasar planejamento urbano e políticas públicas. Durante a V Reunião do Grupo de Benchmarking, realizada em Belo Horizonte em 21 e 22 de novembro de 2019, Rafael Pereira, do Ipea, mostrou como empregou dados de GTFS para medir a acessibilidade em várias capitais brasileiras. Pode-se, por exemplo, cruzar informações sobre tempos de deslocamento e concentração de empregos para aferir o acesso a oportunidades de moradores de diferentes regiões da cidade.

Além de medir a acessibilidade, os dados permitem prever o impacto de intervenções de urbanismo, transporte e mobilidade na acessibilidade, servindo também de insumo para planejar o uso do solo e a expansão da cidade.

Este post faz parte de uma série de conteúdos produzidos a partir dos debates possibilitados pelo Grupo de Benchmarking QualiÔnibus. O Programa QualiÔnibus é desenvolvido pelo WRI Brasil com o apoio financeiro e conceitual da FedEx Corporation e tem o objetivo de qualificar o transporte coletivo por ônibus nas cidades brasileiras. Leia mais conteúdos sobre o programa aqui.