Os Estados Unidos reuniram 40 líderes mundiais na Cúpula de Líderes sobre o Clima, que aconteceu em formato virtual, para acelerar a resposta global à crise climática e manter ao alcance a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C. Realizado no Dia da Terra (22 de abril), cinco anos depois da assinatura formal do Acordo de Paris, o encontro foi uma oportunidade valiosa para obter compromissos climáticos de alguns dos maiores emissores. A reunião também plantou as sementes para ações futuras por parte de outros países nos meses que antecedem a conferência climática da COP26 em Glasgow.

A seguir, um resumo dos altos e baixos:

Quais países fortaleceram suas metas de redução de emissões?

Os Estados Unidos se mostraram firmes com o compromisso ousado de reduzir as emissões de gases de efeito estufa entre 50% e 52% abaixo dos níveis de 2005 até 2030 – essa quantidade é quase o dobro dos cortes prometidos por Obama para 2025. Uma pesquisa do WRI e outros parceiros aponta diversas trajetórias para alcançar essa meta ambiciosa. Aliada ao Plano de Emprego Americano, a meta vai ajudar a estimular a inovação, impulsionar os negócios e a formar a base de uma economia mais forte que apoiará a geração de empregos em todo o país. Uma nova análise do WRI descobriu que as oportunidades de trabalho no setor de energia limpa já superam as do setor de combustíveis fósseis em quatro dos cinco condados rurais.

O Brasil passou sua meta de atingir a neutralidade em carbono de 2060 para 2050, mas não deu nenhum indicativo de que reavaliará a fraca meta para 2030, anunciada em dezembro do ano passado – leia o posicionamento de Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil sobre o anúncio. Considerando os dados utilizados para embasar a meta de 2030, esta é, na verdade, menos ambiciosa que a apresentada pelo país em 2015.

O Japão se comprometeu a reduzir suas emissões em 46% em relação aos níveis de 2013 até 2030 e a se esforçar para cortá-las em 40%, conforme atestou o primeiro-ministro japonês, Yoshihide Suga. Essa meta é um avanço significativo em comparação ao objetivo lamentavelmente inadequado apresentado pelo Japão no ano passado (uma redução das emissões em apenas 26% em relação aos níveis de 2013). Uma coalizão de 174 empresas japonesas apoiou a meta de redução de 50%, indicando como uma ação climática ambiciosa pode gerar mais empregos e promover um crescimento econômico duradouro.

O Canadá também fortaleceu sua meta de redução de emissões para 2030, visando cortar as emissões entre 40% e 45% em relação aos níveis de 2005. Trata-se de um avanço importante em comparação à meta anterior (redução de 30%), mas fica aquém de compromissos mais fortes, como o do Reino Unido, da União Europeia e, agora, dos Estados Unidos e do Japão. O país deveria rever essa meta e mirar mais alto.

(Procurando por uma maneira de comparar essas promessas a partir do mesmo ano base? Confira esse gráfico com a comparação das metas.)

A China destacou que vai “limitar estritamente o aumento do consumo de carvão durante o 14º Plano Quinquenal e eliminá-lo de forma gradativa no 15º Plano Quinquenal”, que começa em 2026. E, pouco antes da cúpula, o país se comprometeu a ratificar e implementar a Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal, reduzindo gradualmente a produção e o consumo de HFC.

A África do Sul afirmou que suas emissões cairiam a partir de 2025, uma década antes do anunciado anteriormente.

Junto às novas metas de redução de emissões de outros países, a União Europeia consagrou em lei sua meta de reduzir as emissões em 55% em relação aos níveis de 1990 até o final da década. O Reino Unido reforçou sua meta já existente para 2030, de reduzir as emissões em 68%, com uma nova promessa: um corte de 78% até 2035.

A Índia e os Estados Unidos, por fim, anunciaram um novo acordo entre os dois países, a Parceria Índia-EUA da Agenda 2030 para o Clima e Energia Limpa, para mobilizar investimentos em tecnologias limpas e ajudar a Índia a atingir sua meta de 450 gigawatts de capacidade de energia renovável até 2030.

Alguns países, como a Austrália e a Indonésia, não apresentaram nada de novo, enquanto outros não fortalecem seus esforços no ritmo e escala necessários para combater a crise climática. E mesmo as novas promessas mais ambiciosas estão aquém de determinados marcos, incluindo algumas análises a respeito de trajetórias equitativas alinhadas à meta de 1,5°C.

Países em desenvolvimento e vulneráveis, que estão sentindo a violência dos impactos mais perigosos e onerosos das mudanças climáticas, utilizaram a cúpula para reivindicar que os maiores emissores se comprometam com metas mais ambiciosas até a conferência em Glasgow.

Houve novas promessas de financiamento?

Com os Estados Unidos ausentes das negociações de financiamento climático nos últimos quatro anos, havia muito interesse em relação ao que o país apresentaria dessa vez. Em um movimento bem recebido, Biden novamente comprometeu o país com o financiamento climático externo, estabelecendo a meta de ampliar os recursos para até US$ 5,7 bilhões por ano até 2024, com cerca de um quarto desse valor alocado para adaptação. O plano de financiamento climático internacional de Biden também destaca processos importantes para que considerações climáticas sejam incorporadas por todos os departamentos governamentais evolvidos em questões de financiamento externo e inclui o compromisso de encerrar o financiamento público internacional para combustíveis fósseis.

Mesmo assim, embora o retorno dos Estados Unidos ao financiamento climático seja positivo, muitos outros países desenvolvidos continuaram a aumentar suas contribuições ao longo dos últimos quatro anos, de forma que os EUA ainda têm muito a fazer para alcançá-los. Por exemplo, o plano perdeu a oportunidade de estabelecer um novo compromisso com o Fundo Verde para o Clima, e o US$ 1,2 bilhão que Biden solicitou até agora não cumpre a promessa de US$ 2 bilhões feita pelo governo Obama-Biden, muito menos iguala o nível de esforço que muitos outros países desenvolvidos mostraram em 2019, quando dobraram seus compromissos com o fundo. Os valores estabelecidos no plano de financiamento climático de Biden não serão suficientes para atender às necessidades urgentes de apoio dos países vulneráveis, especialmente no que diz respeito à adaptação, nem colocarão os Estados Unidos em uma posição de liderança entre os países desenvolvidos.

Oferecer financiamento aos países em desenvolvimento, principalmente para os mais vulneráveis, é um dos pilares do Acordo de Paris, estimulando compromissos de redução de emissões mais ambiciosos e ajudando outras nações a administrarem os impactos das mudanças climáticas. Mas os países desenvolvidos ainda não alcançaram o objetivo de mobilizar US$ 100 bilhões por ano em financiamento climático para as nações em desenvolvimento entre 2020 e 2025. E a pandemia e as profundas crises econômicas estão aumentando as vulnerabilidades e diminuindo a capacidade de muitos países de investir em ação climática e desenvolvimento sustentável. Na cúpula, houve reivindicações por parte dos líderes da Aliança dos Pequenos Estados Insulares, dos Países Menos Desenvolvidos e do Fórum dos Vulneráveis ao Clima por uma reforma do sistema financeiro e por mais solidariedade por parte dos países mais ricos em apoio a suas necessidades urgentes. Essa cooperação é essencial para fortalecer a habilidade dos países de se adaptarem aos impactos climáticos e arcarem com as perdas e danos.

Se os Estados Unidos deixaram a desejar, outros países desenvolvidos como Canadá, França, Alemanha e Itália não apresentaram nenhum novo compromisso de financiamento climático. Esses países precisam fazer isso nos próximos meses para que se possa confiar que a meta dos US$ 100 bilhões estabelecida em 2009 será finalmente cumprida.

Um ponto positivo da cúpula foi a promessa da Coreia do Sul de interromper o financiamento externo para usinas de carvão. O anúncio sinaliza com a mensagem de que a era dos combustíveis fósseis está prestes a acabar. O foco agora está no Japão e na China, os dois governos remanescentes que ainda financiam a construção de usinas de carvão em outros países. A expectativa é de que sigam o exemplo da Coreia do Sul e redirecionem seu financiamento externo para fontes limpas de energia.

Tanto os Estados Unidos quanto o Reino Unido (anfitrião da COP26) indicaram que veem o financiamento privado como uma das principais peças desse quebra-cabeça. Nessa frente, uma das iniciativas é a nova Aliança Financeira de Glasgow por Emissões Líquidas Zero, formada por gestores e proprietários de ativos e por uma nova aliança de bancos que se compromete em apoiar a transição para emissões líquidas zero no máximo até 2050. A aliança abrange empresas que, juntas, são responsáveis por mais de US$ 70 trilhões em ativos.

Mais coerência, coordenação e trocas de aprendizados entre essas iniciativas poderia ser algo bastante benéfico. Para promover mudanças urgentes em termos de investimentos, as instituições financeiras precisam se comprometer com metas robustas e cientificamente embasadas para 2030, encerrar o financiamento disponibilizado a empresas que estiverem construindo ou ampliando infraestruturas e ativos de carvão, evitar a dependência de compensações, melhorar o envolvimento com clientes e investidores e garantir que a transição para emissões líquidas zero seja justa e equitativa.

E a conservação das florestas?

As florestas tropicais podem fornecer mais de 20% da mitigação climática necessária até 2030, mas atualmente recebem apenas cerca de 3% do financiamento climático. Noruega, Reino Unido e Estados Unidos, junto a grandes corporações globais (Amazon, Airbnb, Bayer, BCG, GSK, McKinsey, Nestlé, Salesforce e Unilever), anunciaram uma nova parceria para preencher essa lacuna, aumentando de forma significativa o financiamento para reduzir as emissões causadas pelo desmatamento e pela degradação florestal em países tropicais e subtropicais. A Coalizão Reduzindo Emissões pela Aceleração do Financiamento Florestal (LEAF, na sigla em inglês) deve mobilizar pelo menos US$ 1 bilhão este ano.

A Coalizão tem o objetivo de abordar as duas principais preocupações referentes à integridade do financiamento de mercado para reduções de emissões florestais e, para isso, estabelece um alto padrão para a participação. Em primeiro lugar, o financiamento será limitado a reduções de emissões de alta qualidade, verificadas conforme o padrão independente ART TREES. E, segundo, a Coalizão estipula que os participantes do setor privado se comprometam publicamente com metas de descarbonização cientificamente embasadas, quantificadas e verificadas de forma independente, a fim de garantir que o financiamento florestal seja adicional (em vez de um substituto) aos esforços das empresas para reduzir suas próprias emissões.

Será crucial que a Coalizão LEAF cumpra seu compromisso de envolver todos os principais atores, incluindo comunidades indígenas e locais. A importância desses grupos ressoou ao longo da semana: a vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, insistiu que “consideremos suas percepções e experiência em nossos esforços para avançar”. Essas comunidades são lideranças essenciais na luta. Governos de países ricos em florestas também falaram sobre as ações necessárias para a sua conservação. O presidente da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi, também presidente da União Africana, ressaltou a necessidade de reformas para proteger as florestas tropicais da Bacia do Congo, e o Ministro Lee White, do Gabão, destacou a necessidade de investimento para desenvolver alternativas econômicas sustentáveis para interromper a destruição da floresta tropical.

E a partir daqui, para onde vamos?

Em conjunto, os novos compromissos nacionais e outros anúncios feitos durante a cúpula deram um impulso necessário na preparação para a COP26 em Glasgow – em muito graças ao reengajamento dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, coletivamente estamos ainda longe do necessário para combater as mudanças climáticas. Nos meses que restam até a COP26, mais países entre os maiores emissores devem apresentar metas de redução de emissões ambiciosas para 2030, incluindo China, Coreia do Sul, Indonésia, Índia, Austrália, Rússia e Arábia Saudita. E os países com metas mais fracas devem fortalecê-las.

Além disso, os países vulneráveis precisam da renovação do compromisso, pelos países do G7, de oferecer o financiamento necessário para que possam adotar tecnologias mais limpas e se proteger dos impactos climáticos cada vez mais severos. Os Estados Unidos podem ter inspirado o mundo com sua ambiciosa meta de redução de emissões, mas o aumento do financiamento – pelos EUA e por outros países desenvolvidos – será crucial para que o país recupere sua posição de liderança climática e, com isso, inspire uma ação climática ainda mais forte em todo o mundo.


Este artigo foi publicado originalmente no WRI Insights.