Desde antes da assinatura do Acordo de Paris, em 2015, pesquisas mostram que o mundo teria muito a ganhar com uma economia verde. O Brasil tem grande potencial para um modelo de desenvolvimento capaz de se beneficiar e, ao mesmo tempo, preservar o imenso capital natural existente. Com base em dados e evidências, o estudo “Uma Nova Economia para uma Nova Era: elementos para a construção de uma economia mais eficiente e resiliente para o Brasil” mostrou que sim, uma economia verde significará mais empregos e maior crescimento econômico, com ganhos sociais e ambientais.

O trabalho feito a partir de modelagens econômicas e extensa revisão de estudos científicos cria um ponto de partida para a discussão de medidas concretas para uma nova economia. Essa foi a proposta do debate realizado no webinar Nova Economia Para o Brasil: caminhos para a retomada verde, com a participação de representantes do governo federal, empresas privadas, setor financeiro e sociedade civil. Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil apresentou os principais resultados do estudo e os participantes discutiram alguns caminhos para colocar em prática ações para uma retomada verde diante da crise fiscal que o país se encontra, agravada pelos efeitos da pandemia causada pela Covid-19.

Confira o vídeo completo do debate:

Abaixo, você encontra um resumo das conversas, divido em algumas áreas-chave discutidas pelos participantes.

Benefícios econômicos e ambientais da agropecuária sustentável

Peça fundamental nas engrenagens da economia nacional, a agropecuária está entre os pilares de uma futura economia verde. Ao longo das últimas décadas, a cadeia de valor do agronegócio se modernizou e cresceu significativamente, se tornou responsável por um em cada três empregos no Brasil e responde pode cerca de 22% do Produto Interno Bruto (PIB). A sua alta dependência dos recursos naturais também é uma vantagem competitiva: o estudo mostra que é possível crescer e ganhar competitividade conservando e restaurando esses ecossistemas sem sacrifícios sociais ou econômicos.

Conforme João Adrien Fernandes, Chefe da Assessoria de Assuntos Socioambientais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que participou do webinar substituindo a ministra Tereza Cristina, essa visão de futuro se mostra alinhada aos objetivos traçados pela pasta. Durante o evento, ele ressaltou a visão de que a agricultura é uma atividade iminentemente produtora de matéria-prima renovável e essencial para uma economia de base circular. Fernandes destacou os três focos da agenda que estabelece diretrizes para o desenvolvimento sustentável da agropecuária brasileira na visão do Mapa: inclusão produtiva de pequenos produtores, regularização ambiental e fundiária e o estímulo à inovação no campo.

Além disso, mostrou alguns resultados e desafios para a gestão da agropecuária no país. Por exemplo, destacou que o Plano ABC, nos últimos 10 anos, contribuiu com algum grau de melhora em 32 milhões de hectares de pastagens degradadas. O resultado foi obtido mesmo com um volume de financiamento para práticas sustentáveis correspondente a uma pequena fração da agricultura convencional – no Plano Agrícola e Pecuário 2018/2019, por exemplo, somente R$ 1 bilhão foi alocado no Plano ABC, comparado a R$225,59 bilhões alocados para o Plano Safra. Embora o último Plano Safra tenha ampliado recursos para a agricultura de baixo carbono e para a restauração florestal, os números mostram que mais incentivos financeiros às melhores práticas ambientais poderiam impulsionar o crescimento sustentável do agro.

“A agricultura é solução para os desafios desse novo milênio. A intensificação sustentável é a grande diretriz que nós temos que focar e tentar encontrar meios para sua efetiva implementação”, afirmou Fernandes. Para ele, os recursos para isso serão fundamentais, por exemplo os que têm origem em títulos verdes, além de assistência técnica e extensão rural (ATER) e apoio de toda a sociedade.

Inovação tecnológica para a competitividade da indústria

Ex-Ministro da Fazenda com atuação relevante tanto no setor público quanto privado, o economista Joaquim Levy falou sobre algumas oportunidades para a retomada verde no Brasil. Quais seriam os setores que o país deveria estimular e quais deveriam passar por adaptações para a construção deste futuro mais próspero, justo e resiliente ao clima?

Levy percorreu alguns caminhos, destacando áreas em que avanços tecnológicos transformariam nossa extraordinária capacidade de produção sustentável em realidade. Um deles é no setor de energia, que já tem uma matriz relativamente limpa comparada à média mundial, mas que poderia avançar para um modelo com maior participação de fontes renováveis. "Nosso mercado de energia integrado permite juntar a parte eólica, solar e hidrelétrica, além de biomassa e outros componentes, até combustíveis fósseis, de uma maneira que talvez nenhum país consiga atualmente. Precisamos continuar inovando nessa área", destacou.

Há uma conexão também entre as áreas florestal e industrial, de acordo com Levy, que ressaltou a capacidade de uma produção em escala bastante grande de aço com baixa emissão de gás de efeito estufa (GEE). Hoje esse potencial é usado apenas parcialmente, embora uma porcentagem da produção de ferro gusa se dê a partir de uso de carvão vegetal com origem em florestas plantadas e avanços tenham ocorrido na aciaria elétrica. Para o economista, a combinação dessas práticas, reduzindo o impacto ambiental da produção, colocaria o Brasil em grande vantagem competitiva no mercado de aço.

A integração da agricultura e da pecuária com florestas, além do plantio de árvores em larga escala para a produção de madeira, por exemplo, poderiam alimentar um potencial mercado de carbono, aumentando as fontes de renda do produtor. Mais pesquisas sobre o uso da madeira poderiam impulsionar sua utilização na construção civil. "Isso tudo exige planejamento, bastante discussão, e um dos grandes valores desse documento é criar uma estrutura a partir da qual se pode desenvolver essas discussões", pontuou Levy.

O papel das florestas plantadas na economia verde ganhou destaque na participação de Walter Schalka, presidente da Suzano, a maior empresa do mundo no setor. Ele destacou o potencial da madeira também na substituição do plástico. A Suzano tem a meta de substituir 10 milhões de toneladas de plásticos nos próximos 10 anos pela aplicação da celulose, por exemplo na indústria têxtil em substituição ao polyester, ou na criação de embalagens para substituir as plásticas de uso único.

Schalka reforçou a necessidade de regulamentação de alguns setores para permitir um crescimento adequado à nova realidade e o aproveitamento da janela de oportunidades aberta no cenário atual para investimentos sustentáveis. “Pode ser um enorme potencial para o Brasil, de mudar a matriz econômica, gerar empregos, investir em educação, reduzir a desigualdade de oportunidades. Podemos abrir um novo horizonte para o Brasil a partir da pandemia, que pode ser um momento de repensar o que queremos para daqui a 20 anos”, afirmou.

Papel do setor privado na transição para uma nova economia

Há um movimento claro do mercado financeiro em direção à retomada verde. Os investidores estão assumindo um papel mais ativo na cobrança de governos por práticas ambientalmente responsáveis, que significam na prática uma redução de risco para o setor financeiro. Melhor clima e melhor crescimento não são incompatíveis, como lembrou Caio Koch-Weser, membro da Comissão Global da New Climate Economy. "Não há país com melhores condições, eu acredito, do que o Brasil em termos de capital natural e possibilidade de transformação para se tornar um campeão de sustentabilidade com forte crescimento econômico e integração social. [O país conta] com empresariado, pesquisa e desenvolvimento capazes de tornar o Brasil uma liderança global no mundo de amanhã", destacou Koch-Weser, que também é ex-secretário de Estado de Finanças da Alemanha.

Lamentavelmente, em muitas áreas o Brasil tem ido na direção oposta, lembrou Koch-Weser, com aumento no desmatamento da Amazônia e esvaziamento de órgãos ligados à sustentabilidade, o que põe em risco a relação com mercados do agronegócio e o acesso ao capital internacional necessário para uma retomada de crescimento. Ele destacou o papel fundamental que o setor privado terá na transição da economia e três pontos de ação para o país, baseado na experiência recente da Europa na construção do Green Deal:

  • Formular entre Ministério da Economia, Banco Central e bancos públicos e privados uma estratégia nacional para a criação de um setor financeiro sustentável;
  • Introduzir a divulgação obrigatória pelas empresas dos riscos financeiros relacionados às mudanças climáticas, sob supervisão do Banco Central;
  • Iniciar a precificação do carbono, como está sendo feito na China e na Europa, inclusive para evitar restrições tarifárias futuras no acesso a mercados globais.

“Esses caminhos exigiriam decisões políticas difíceis, mas acredito que, como em outros países, o setor privado pode liderar e avançar nos primeiros passos”, comentou Koch-Weser. Questionado pelo moderador do evento, Marcelo Furtado, diretor de Sustentabilidade e sócio-fundador da ZSCore/BlockC e presidente do Conselho do WRI Brasil, Walter Schalka respondeu que a Suzano já divulga todas as questões ambientais no seu site e assumiu o compromisso de também incluir o risco ambiental dentro do mapa de riscos que a empresa divulga.

Retomada verde é a melhor saída da crise atual

O debate mostrou que existem soluções para a recuperação econômica que estão ao alcance do Brasil e, especialmente, que a retomada verde é a melhor saída para a crise que o país se encontra. A pandemia de Covid-19 deixou ainda mais evidentes os desafios causados pela desigualdade social e a necessidade de uma recuperação econômica que seja inclusiva e sustentável. Acesse o estudo Uma Nova Economia para uma Nova Era: elementos para a construção de uma economia mais eficiente e resiliente para o Brasil para entender como isso pode ser feito sem rupturas, a partir de avanços em setores como infraestrutura, indústria e agricultura.