O plantio de uma árvore começa com uma semente ou uma muda. Logo, se queremos restaurar e reflorestar mais de 12 milhões de hectares no Brasil – o equivalente ao território do estado do Ceará – precisamos de muitas sementes. O problema é que, atualmente, não temos quantidade suficiente de sementes de árvores nativas, seja para a restauração ecológica, seja para o reflorestamento com objetivo de comercialização de produtos florestais madeireiros e não madeireiros.

Muitas das sementes hoje disponíveis carecem de tecnologia. Além disso, nos falta o conhecimento biológico de muitas plantas para compreender como elas se comportam num plantio de restauração. O resultado é que faltam sementes no mercado, e muitos projetos de restauração correm o risco de utilizar sementes de baixa qualidade, tendo um baixo desempenho na restauração.

O elo das sementes na restauração de larga escala também é importante porque pode ajudar na manutenção de importantes fragmentos florestais e ecossistemas, cuja integridade e saúde são fundamentais para garantir plantios futuros. A proteção real das unidades de conservação, reservas indígenas, quilombos, bem como áreas em propriedades particulares são essenciais para garantir bom provimento de sementes saudáveis para o futuro da humanidade. Sem a saúde dessas áreas não teremos economia florestal e agroflorestal, segurança hídrica e alimentar, para uma economia forte no país.

Mas o Brasil tem em mãos uma oportunidade de, a partir das sementes, semear uma economia florestal sólida, que gere emprego e renda para comunidades e pequenos produtores rurais, respeite os conhecimentos locais e tradicionais e que tenha em seu cerne a tecnologia e a produtividade.

A economia da semente

No começo do ano, um estudo inédito publicado na revista científica Forests deu o primeiro passo para entender quantas sementes o Brasil precisa para restaurar 12 milhões de hectares de florestas. O trabalho identificou que o Brasil precisa produzir entre 3,6 mil a 15,6 mil toneladas de sementes nativas para poder restaurar os 12 milhões de hectares.

Essa estimativa, que por si só já ajuda tomadores de decisão a avaliar a importância das sementes, ajuda a entender o que significaria para o Brasil coletar e produzir essas sementes. O estudo modelou esses dados, e o resultado é surpreendente. Segundo os autores, a coleta e a produção de sementes para a restauração florestal poderia mover uma economia de até US$ 146 milhões, gerando até 57 mil empregos em áreas rurais de todo o Brasil.

Esse recurso pode ajudar a complementar a renda de famílias no campo, exercendo um papel importante de redução da pobreza. As sementes e mudas produzidas podem ser utilizadas em projetos de restauração com finalidade ecológica, melhorando por exemplo solo e corpos d’água em propriedades e adequando o produtor às regras do Código Florestal (Lei 12.651/12), ou podem ser utilizadas em projetos de reflorestamento com fins econômicos, para produzir madeira de qualidade ou produtos florestais não madeireiros. As sementes e mudas seriam assim o primeiro elo na criação de uma economia florestal e agroflorestal que promove o desenvolvimento sustentável e ainda permite ao Brasil cumprir seus compromissos ambientais internacionais.

O exemplo das redes de sementes

O conhecimento tradicional e a participação das comunidades locais são cruciais para permitir que a economia das sementes possa decolar. Já temos alguns exemplos positivos de engajamento de comunidades nessa cadeia de produção: as redes de sementes. São redes de formação de coletores, promoção de trocas, atendimento de encomendas e comercialização de sementes de árvores nativas e outras plantas de interesse ecológico ou econômico, unindo agricultores familiares, produtores rurais, governos, organizações da sociedade civil e comunidades tradicionais ou indígenas.

Um dos exemplos mais bem consolidados fica na Amazônia. A Rede de Sementes do Xingu conta com mais de 500 coletores, que fornecem sementes para produtores e agricultores da região interessados em restauração e plantio florestal. Estima-se que, em mais de uma década, a rede já gerou R$ 4 milhões em renda, distribuída para as famílias dos coletores na região e se tornando um importante meio de vida para os coletores. Isso sem contar o benefício ecológico: a restauração de mais de 6 mil hectares de áreas degradadas na Amazônia.

Além da rede do Xingu, outras redes importantes em funcionamento são as do Portal (MT), Cerrado do Pé (GO), Tupygua (ES), Arboretum (BA) e Vale do Ribeira (SP).

P&D para avançar

Além da economia e do conhecimento tradicional, há um elo fundamental para que possamos destravar o gargalo das sementes no Brasil: tecnologia. As espécies nativas de árvores brasileiras nunca contaram com a pesquisa e desenvolvimento que historicamente tornaram produtivas espécies agrícolas e mesmo florestais, como pinus e eucalipto.

Um estudo publicado pelo WRI Brasil e parceiros em 2019 buscou identificar lacunas e prioridades na pesquisa e desenvolvimento das espécies nativas brasileiras para restauração e reflorestamento. O estudo identificou oito áreas em que é necessário investimento em ciência. Não por coincidência, uma das áreas é justamente a de sementes e mudas.

A pesquisa científica pode ajudar a selecionar as melhores sementes e mudas, identificar árvores matriz que produzem sementes de melhor qualidade, e desenvolver conhecimento de clonagem e melhoramento genético das árvores brasileiras. Para viabilizar essa pesquisa, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, em parceria com o WRI Brasil, está trabalhando numa Plataforma de Pesquisa & Desenvolvimento. Com ciência por trás das sementes, nossas árvores podem crescer e poderemos colher os frutos de uma economia florestal rentável e sustentável.