O Brasil tem uma grande oportunidade no setor agropecuário: a de expandir seu rebanho bovino ao mesmo tempo em que cumpre o Código Florestal, protege florestas e regenera áreas naturais. Estudo publicado na revista científica Royal Society Open Science, de Londres, mostrou que a recuperação de pastagens degradadas pode aumentar o rebanho bovino brasileiro no tamanho de um Uruguai.

Para isso, é preciso melhorar a qualidade dos 69 milhões de hectares de pastagens degradadas no país. Recuperar essas áreas pode aumentar a produtividade da pecuária sem colocar em risco as florestas e a biodiversidade, gerando oportunidades de trabalho no meio rural e retornos econômicos para o país. Uma das formas de fazer isso é por meio da integração entre áreas de cultivo com pecuária e florestas.

Em uma série de três artigos, o WRI Brasil mostra modelos de restauração de paisagens e florestas com fins econômicos, identificando o importante papel que eles exercem dos pontos de vista ambiental, econômico e social. Neste texto, entenda o que é e como funciona a integração de lavoura e pecuária com as florestas, conhecida como iLPF.

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O que é a iLPF e quais as vantagens para a economia e a natureza

Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF), também conhecida como sistema silvipastoril, é uma estratégia de produção sustentável que integra pecuária, atividades agrícolas e florestais, buscando efeitos sinérgicos entre os componentes e otimizando aumentos da produtividade com a conservação de recursos naturais. Essa integração pode ser feita ao mesmo tempo ou de forma sucessiva, plantando um tipo de cultura que é, depois, substituído pela criação de animais ou pela plantação de vegetação nativa. São quatro os arranjos possíveis:

  • Integração Lavoura, Pecuária e Floresta (iLPF)
  • Integração Lavoura e Pecuária (iLP)
  • Integração Pecuária e Floresta (iPF)
  • Integração Lavoura e Floresta (iLF)

Em um país onde a pecuária é responsável por uma parcela importante do PIB do agronegócio, adotar a iLPF permite aumentar a produtividade sem a necessidade de abrir novas áreas de pastagens. Também é uma alternativa atrativa para a restauração porque, assim como a silvicultura de nativas e os sistemas agroflorestais, alia benefícios econômicos e ecológicos.

Segundo nota técnica da Embrapa, entre os benefícios ambientais da iLPF há a melhora os nutrientes no solo, o bem-estar dos animais e a proteção dos recursos naturais, além dos ganhos com o cultivo de alimentos saudáveis. Em termos econômicos, a técnica aumenta a produção de grãos, fibras, carne, leite e produtos madeireiros e não madeireiros e, com isso, gera empregos diretos e indiretos e contribui para a renda dos produtores.

Além disso, a iLPF pode ser uma ferramenta eficaz para que produtores rurais se protejam de eventos climáticos extremos. O estudo Papel do Plano ABC e do Planaveg na Adaptação da Agricultura e da Pecuária às Mudanças Climáticas avaliou o impacto de uma série de tecnologias agrícolas previstas no Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC), incluindo os sistemas integrados. A análise da iLPF mostra que ela melhora o clima local e a qualidade do solo, reduz eventos extremos e pragas, além de trazer ganhos em produtividade.

Quem está fazendo iLPF no Brasil

A integração Lavoura-Pecuária-Floresta está prevista nas políticas públicas brasileiras, como o Plano ABC e o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg). Além disso, o país se comprometeu com uma meta de implementar 5 milhões de hectares de iLPF em todo o país até 2030.

Segundo a Rede iLPF, há no Brasil cerca de 17 milhões de hectares com produção em sistemas integrados. A maior parte (em torno de 80%) integra lavoura e pecuária, sem introduzir árvores no sistema. A parte que integra o componente florestal utiliza predominantemente o eucalipto, pelo seu rápido crescimento e outros fatores que facilitam a implantação pelo produtor. A Rede projeta uma meta de atingir 35 milhões de hectares com o sistema iLPF até 2030, mostrando que há ainda uma grande oportunidade para restaurar e integrar florestas nas produções agropecuárias.

Com a grande biodiversidade e o potencial agrícola que o Brasil tem, é possível aproveitar esta oportunidade com ainda maiores ganhos ecológicos e, inclusive, econômicos, ao se utilizar espécies florestais nativas nos sistemas iLPF

Integração de pecuária com plantio de árvores nativas

Um caso piloto de como as árvores podem impulsionar a pecuária é o caso bem-sucedido de Vila Velha (ES), com a experiência de Jurandir Melado na Fazenda Ecológica. A fazenda faz o manejo de pastagens ecológicas utilizando o Sistema Voisin Silvipastoril, técnica adaptada por Jurandir a partir do método Voisin, que possibilita o equilíbrio entre solo, pasto e gado, aliado à introdução de árvores para conforto térmico dos animais. A experiência tem apoio do projeto Renovando Paisagem, que em uma de suas frentes de ação implementa unidades demonstrativas utilizando técnicas de produção sustentável.

Outro projeto piloto de pecuária com árvores acontece em Teixeira de Freitas, na Bahia. O Ministério Público Estadual da Bahia, com apoio do WRI Brasil, desenvolve o projeto Pecuária Sustentável, que utiliza a mesma técnica para estimular a atividade pecuária a partir do manejo sustentável das pastagens. Ao permitir a rotatividade do gado em áreas delimitadas previamente, aliando o bem-estar dos animais ao descanso necessário do solo e do pasto, o projeto espera aumentar a produtividade dos produtores locais sem gerar danos ao meio ambiente. Segundo técnicos contratados pelo projeto, a expectativa é que o sistema Voisin Silvipastoril consiga aumentar em até 20% a produção de leite e aumentar em até quatro vezes os ganhos no gado de corte.

iLPF: um ganho para a restauração e para a economia

A pecuária bovina é uma atividade importante para a economia brasileira, e recuperar áreas de pastagens degradadas sem aumentar a pressão sobre os recursos naturais, por meio de alternativas como a iLPF, é a melhor estratégia para expandir o setor.

Segundo estudo da iniciativa Nova Economia para o Brasil, a recuperação de pastagens degradadas é peça-chave para uma retomada econômica verde. O estudo demonstrou que o esforço de recuperação custaria em torno de R$ 25 bilhões – apenas 10% do montante do Plano Safra – e, em dez anos, esse valor não apenas seria compensado como resultaria em um retorno de R$ 19 bilhões.

A recuperação de pastagens degradadas e a expansão da integração Lavoura, Pecuária e Floresta andam juntas. A pecuária bovina é uma atividade altamente produtiva em diversas regiões do Brasil, mas sistemas extensivos e de baixa tecnologia ainda fazem com que o setor não alcance todo o seu potencial de eficiência. Modelos que aliam a produção de alimentos saudáveis à criação de animais e ao cultivo de espécies arbóreas, como a iLPF, ajudam a promover essa mudança mantendo ou aumentando a produtividade, conciliando crescimento econômico e o cuidado com a natureza.

Artigo alterado em 22 de abril de 2024 para correção de informação